Em um comício que contou com a participação da artista pop Beyoncé, uma das mais importantes cantoras da sua geração, a vice-presidente dos Estados Unidos e candidata à Casa Branca, Kamala Harris, fez um apelo às mulheres americanas em um discurso focado no direito ao aborto, derrubado nacionalmente pela Suprema Corte com o voto de três juízes indicados por seu adversário, Donald Trump.
“Quando era presidente, Trump escolheu três juízes para a Suprema Corte com a intenção que eles derrubassem [o direito ao aborto], e eles fizeram isso, e agora mais de 20 estados têm alguma proibição ao aborto, alguns sem exceção para estupro ou incesto. Isso é imoral”, disse Kamala.
“O impacto das proibições de aborto do Trump gerou histórias terríveis”, continuou Kamala, colocando na conta do ex-presidente as leis passadas em uma série de estados governados por republicanos que restringiram a prática. O próprio Trump, ciente que a opinião pública americana discorda de proibir o aborto, vem dizendo que cabe aos estados tomar essa decisão.
No discurso, Kamala recontou casos recentes de mulheres que foram acusadas de crimes após abortos espontâneos, ou de vítimas de abuso sexual que tiveram que sair de seus estados para abortar, ou ainda histórias de mulheres que não conseguiram tratar complicações de gravidez por causa da insegurança jurídica causada pela proibição do aborto em alguns estados.
“Às mulheres que se sentem marginalizadas, como se elas tivessem feito algo de errado, como se fossem criminosas, eu digo: nós te ouvimos, e estamos com vocês”, disse Kamala.
Se dirigindo a pessoas religiosas, que costumam ser contra a interrupção da gravidez, Kamala afirmou que “não é preciso abandonar sua fé ou crenças pessoais para concordar que o governo não pode se meter na decisão de uma mulher. Ela pode falar com seu padre, ou pastor, ou rabino ou imame. Mas o governo não pode se meter.”
A oposição de grande parte do Partido Republicano ao direito ao aborto vem sendo usada pela campanha de Kamala como um dos temas mais eficazes para mobilizar sua base e lutar pelo voto do eleitor indeciso —pesquisas de opinião mostram que a maioria dos americanos é contrária a uma proibição da prática, que foi legal em todos os EUA por quase 50 anos antes de ser derrubada pela Suprema Corte em 2022.
Discursando antes de Kamala e acompanhada da cantora Kelly Rowland, Beyoncé pediu voto na vice-presidente. “Para mulheres ao redor do país, eu digo: precisamos de vocês. Sua liberdade é um direito humano, e seu voto é uma das maneiras mais poderosas de expressar isso”, disse.
“Não estou aqui como uma celebridade, não estou aqui como uma política, estou aqui como uma mãe. Imagine o sacrifício de gerações de mulheres antes de nossas [para chegarmos até aqui].”
Kamala falou na cidade de Houston, no Texas. O local, além de ser a cidade natal de Beyoncé, foi escolhido pelo simbolismo: o estado é um dos governados pelos republicanos que endureceram leis contra o aborto após a decisão da Suprema Corte que derrubou a garantia do procedimento a nível federal nos EUA.
O Texas, na fronteira com o México, é tradicionalmente vencido por candidatos republicanos, e pesquisas apontam que Trump deve repetir essa tendência sem muitos sustos. Mas o estado também é palco de uma disputa surpreendentemente acirrada entre o republicano Ted Cruz, que é senador pelo estado há 12 anos, e o deputado democrata Colin Allred, que busca substituí-lo.
Levantamentos mostram que Allred e Cruz estão tecnicamente empatados nas intenções de voto no estado, uma perspectiva incomum para um senador tão importante no partido e consolidado no cargo como o republicano. Falando antes de Kamala nesta sexta, Allred acusou Cruz de apoiar a invasão do Capitólio no 6 de janeiro de 2021 e depois “se esconder em um armário de vassouras” enquanto ela acontecia.