Argentina: Senado rejeita megadecreto liberal de Milei – 14/03/2024 – Mundo – EERBONUS
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Argentina: Senado rejeita megadecreto liberal de Milei – 14/03/2024 – Mundo

De forma inédita, o Senado da Argentina rejeitou nesta quinta (14) o megadecreto liberal de Javier Milei. O texto, porém, segue em vigor e só deixará de valer se também for rechaçado por inteiro na Câmara dos Deputados, que ainda não tem data prevista para discuti-lo. É a primeira vez que a Casa veta um decreto deste tipo de um presidente.

Foram 42 votos contra a medida, 25 a favor e 4 abstenções depois de cinco horas de debate. A força governista tem apenas 7 senadores e não conseguiu apoio suficiente da “oposição dialoguista”, composta por partidos de direita, centro-direita e centro. Do outro lado, o peronismo teve o maior peso.

Esta é a segunda derrota do presidente argentino no Congresso em pouco mais de um mês. Em fevereiro, Milei decidiu retirar seu pacote da “lei ônibus” da Câmara, que já havia aprovado o projeto em geral, após discordâncias sobre artigos específicos. Agora, ele tenta negociar uma versão desidratada com governadores, que têm forte influência sobre os legisladores no país.

O texto rejeitado nesta quinta no Senado é o chamado de DNU (Decreto de Necessidade e Urgência), que declara emergência pública até o fim de 2025 e promove uma forte desregulação da economia, revogando ou alterando mais de 300 leis —a parte da reforma trabalhista, porém, foi suspensa pela Justiça e ainda deve ser analisada pela Suprema Corte.

As medidas, anunciadas por Milei em rede nacional dez dias após sua posse, reduzem ou eliminam totalmente regulações de áreas como planos de saúde, aluguéis, comércio e indústria. Também permitem o uso de outras moedas e abrem caminho para a privatização das empresas estatais ao transformá-las em sociedades anônimas.

Outra mudança que elas trazem é a implementação da “política de céus abertos”, que possibilita que companhias aéreas estrangeiras realizem voos domésticos, e a desregulamentação dos serviços de internet por satélite, o que favorece empresas como a Starlink, do magnata Elon Musk, fã declarado de Milei.

A votação desta quinta aconteceu depois de três dias de tensões na Casa Rosada, protagonizadas pela vice-presidente Victoria Villarruel, que na Argentina também é chefe do Senado. Na terça (12), ela atendeu aos pedidos do kirchnerismo para incluir o mega-DNU na sessão desta quinta.

A coalizão opositora vinha insistindo nisso havia mais de um mês, mas nunca avançava porque não conseguia quórum para votar a proposta. A situação, porém, mudou quando um grupo de senadores da oposição não kirchnerista apresentou outro pedido para levar o decreto ao plenário.

Nesta quarta (13), a menos de 24 horas da sessão e enquanto Villarruel ainda tentava negociar o adiamento da votação, o governo publicou um duro comunicado, expressando preocupação “pela decisão unilateral de alguns setores da classe política que pretendem avançar com uma agenda própria e sem consulta”.

Segundo Milei, que há duas semanas tenta impulsionar um “Pacto de Maio” com governadores —para assinar um acordo com dez políticas de Estado para o país e destravar sua “lei ônibus”—, o objetivo desses setores é “obstruir as negociações e o diálogo entre os diferentes setores da liderança política”.

“A potencial rejeição do DNU […] levaria a um grave retrocesso nos direitos e necessidades do povo argentino, implicando, por exemplo, o retorno da Lei de Aluguéis, o retorno ao sistema rígido de planos de saúde sindicais e a anulação da política de céus abertos, entre outros”, escreveu.

“Independentemente de qualquer resultado legislativo, o Poder Executivo reafirma seu compromisso inabalável com o déficit zero, deixando para trás as receitas fracassadas da ‘casta’ política e avançando decididamente em direção ao caminho da prosperidade e da grandeza da nação argentina”, encerrou.

O comunicado foi lido pela imprensa argentina como uma crítica também a Villarruel, o que o porta-voz da Casa Rosada negou nesta quinta. “Interpretaram mal o comunicado”, disse. “Era muito firme mas dedicado a toda a classe política. […] Não há brigas internas nem nenhuma outra questão ou enfrentamento”, afirmou.

Milei foi eleito prometendo mudanças radicais para resolver a crise econômica e a inflação na Argentina, que ultrapassa os 270% anuais e já é a maior do mundo. Desde que assumiu, em 10 de dezembro, o ultraliberal iniciou um acelerado plano com quatro principais frentes.

As primeiras foram uma forte desvalorização do peso oficial, que tem o valor controlado desde os governos anteriores, e um duro corte nos gastos públicos. Esses cortes incluem a suspensão de todas as obras estatais, a redução de subsídios de energia e transporte e o enxugamento de repasses às províncias.

As outras duas frentes são o DNU e a “lei ônibus”. Além disso, o presidente promoveu mudanças na política cambial e monetária, fixando um encarecimento mensal de 2% no dólar oficial e reduzindo a taxa de juros de 133% para 80% até agora, na intenção de que a inflação vá diluindo as dívidas do governo.

Em janeiro, ele comemorou o primeiro superávit financeiro do país desde agosto de 2012. Por outro lado, por enquanto as medidas têm tido um impacto severo no dia a dia dos argentinos, que viram todos os preços explodirem com o fim dos congelamentos, a desvalorização da moeda e o aumento de impostos a importações e exportações.

O poder de compra da população derreteu ainda mais, e a pobreza subiu a 57%. A classe baixa tem cortado refeições, enquanto a classe média diminui a lista do mercado, deixa de ir a restaurantes, opta por marcas mais baratas e cancela viagens ou planos de saúde.

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