O líder chinês Xi Jinping chegará ao Brasil neste fim de semana para a cúpula do G20 no Rio de Janeiro e uma visita de Estado em Brasília. Serão dias de reuniões, muito provavelmente acompanhadas de anúncios de acordos, investimentos e a conhecida pompa que cerca o mandatário toda vez que deixa a China.
Mas, se a parada dele anterior à chegada ao Brasil servir de exemplo, não será difícil para o leitor entender nas entrelinhas dos discursos dele e da sua comitiva como a viagem é um prenúncio da estratégia chinesa rumo a mais quatro anos de Trump.
A passagem de Xi pela América Latina começou na quinta por Lima, capital do Peru, onde chegou para a cúpula do Fórum de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec) e também para a inauguração do megaporto de Chancay.
Sob o selo da Iniciativa de Cinturão e Rota (ICR) e ao custo de US$ 3,5 bilhões (US$ 1,3 bi já investido e o resto escalonado em um plano de várias fases), o projeto representa um dos mais ambiciosos investimentos chineses na América Latina e deve significar uma revolução logística não só para o Peru, mas para a toda região.
Xi, que apenas em duas outras ocasiões participou pessoalmente da inauguração de projetos da ICR, fez questão de estar em Lima para abertura da obra peruana. Em discurso ao lado da presidente Dina Boluarte, usou Chancay como exemplo do compromisso chinês com o multilateralismo e o comércio livre. Era “o nascimento de uma passagem terra-mar para uma nova era” e um elemento fundamental para a prosperidade “do peru e da América Latina”, declarou.
Na sexta, foi a vez de ele enviar o ministro do comércio Wang Wentao para ler a um grupo de CEOs uma mensagem defendendo ação conjunta contra o “aumento do protecionismo” no mundo. Xi disse que as ações unilaterais para “impedir a globalização e promover o isolacionismo com todo tipo de desculpas não são nada além de um retrocesso”.
Em ambas as ocasiões, não foi necessário mencionar por nome a quem ele se referia: Donald Trump e a tal política de “América Primeiro” que pretende estabelecer toda sorte de tarifas sobre produtos importados que entram nos EUA, não só da China, mas de todo o mundo.
É um tom muito similar ao adotado pelo líder chinês em 2017 e que deve se repetir, com Pequim mais uma vez se posicionando como defensora da globalização diante de uma Washington provinciana e mesquinha.
Especialmente na América Latina, a retórica pode servir como uma contrastante oposição ao que se espera de Marco Rubio, o indicado por Trump para o Departamento de Estado. Cubano-americano, Rubio fala espanhol fluente e costuma classificar os líderes latinos em dois grupos: os de direita, que se alinham aos interesses americanos, e os autoritários esquerdistas, aqueles próximos aos chineses e russos.
A postura dicotômica ignora que na última década foram os líderes de direita a se aproximarem mais de Pequim —a exemplo de Maurício Macri (Argentina) e Iván Duque (Colômbia)—, mas certamente impactará na forma como presidentes como Lula, o colombiano Gustavo Petro e a mexicana Claudia Sheinbaum serão percebidos nos EUA de Trump.
Pequim quer se posicionar como alternativa a este tipo de truculência diplomática, o que, ao menos no Peru, funcionou. Com uma visita apagada de Joe Biden, que também participa do fórum, os veículos de imprensa locais praticamente ignoraram as discussões multilaterais da Apec: preferiram focar no líder chinês que, como definiu um dos maiores canais de TV, “chegou a Lima roubando o show”.
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