O pedido de recuperação judicial da WeWork, startup novaiorquina de espaços de coworking, nos EUA mostrou que hype nem sempre combina com negócios. A empresa nos últimos anos já dava sinais de que algo iria dar ruim: em agosto, por exemplo, anunciou que tinha “dúvidas substanciais” sobre a capacidade de manter suas operações.
A informação veio na esteira do comunicado de seu balanço trimestral, que, apesar da receita de US$ 884 milhões (+4% no ano a ano), exibia prejuízo líquido de US$ 397 milhões. Essa era mais uma perda dentre outras registradas pela firma – no mesmo período do ano passado o valor chegou a US$ 635 milhões.
Em 2022, a WeWork também tinha tentado um plano de recuperação com prazo de 12 meses, que incluía corte de gastos e vendas de ações visando a busca por mais capital. Como deu para ver, a medida não deu certo: hoje são US$ 18,7 bilhões em dívidas e US$ 15,1 bilhões em ativos.
Como surgiu a WeWork?
A WeWork foi criada em 2010 por Adam Neumann e Miguel McKelvey sob a promessa de oferecer espaços compartilhados tanto para profissionais quanto para pequenos empreendedores.
A ideia era facilitar o dia a dia de trabalho dessa turma com um local mais confortável e com um “quê” de corporativo, mas sem a necessidade de gastar com salas comerciais. Ao mesmo tempo, quem o frequentasse poderia ter contato com outras pessoas empresas – e garantir o famoso networking.
Logo a startup bombou e passou a ter escritórios em mais de 100 países, incluindo o Brasil. Em 2016, já tinha atingido o valor de mercado de US$ 10 bilhões; em 2017, esse total saltou para US$ 20 bilhões.
A WeWork fez sucesso imediato com investidores diante de sua promessa de escritórios compartilhados
De startup valiosa à queda
Em 2019, a WeWork integrou o conglomerado chamado The We Company, que ainda incluía a WeGrow (voltada para o ramo de educação fundamental) e WeLive (firma de coliving). Após altos investimentos na empresa-mãe, sobretudo do SoftBank, Adam Neumann (então CEO) decidiu mirar a oferta inicial de ações (IPO) em 2019.
Naquele mesmo ano a companhia foi avaliada em US$ 47 bilhões pela instituição financeira (e sua maior investidora). A partir daí a coisa desandou por vários fatores, que explicamos a seguir.
Gastos exagerados
O interesse pelo IPO colocou a WeWork sob os holofotes do mercado e da mídia. Isso envolveu análises mais profundas sobre os números e a gestão da startup, que não era das melhores. O sinal de alerta veio de seus gastos absurdos: em 2018 a receita foi de US$ 1,8 bilhão, enquanto o prejuízo era de US$ 1,9 bilhão. No ano anterior, US$ 886 milhões contra US$ 933 milhões.
- De onde vinham as depesas? A maior parte vinha do aluguel dos espaços compartilhados, que ficavam em localizações corporativas (caras) e exigiam contratos de longo prazo.
Adam Neumann foi então forçado a deixar a cadeira de CEO tanto por conta dos números negativos quanto por seus comportamentos inadequados. Rolavam na mídia histórias de que ele tinha uma sauna dentro de seu escritório e explodia com funcionários, por exemplo.
O cofundador e ex-CEO da WeWork, Adam Neumann, ficou rico enquanto a startup se deu mal
Esse conjunto de fatores fez com que a capacidade de lucrar da startup fosse colocada em xeque tanto pelo Softbank quanto por analistas.
Neumann inclusive chegou a ser processado na justiça por investidores, mas acabou inocentado. Ainda assim, ele não ficou de mãos vazias, acumulando US$ 1 bilhão da venda de suas participações, além de US$ 185 milhões oriundos de sua atuação como conselheiro na empresa.
Pandemia
A pandemia foi outro fator decisivo para o tombo da WeWork tanto por conta do isolamento social quanto pela mudança nas dinâmicas de trabalho — aderência ao home office e híbrido. O resultado foi de salas vazias combinadas à alta rotatividade de membros, despesas de aluguéis e altas taxas de juros.
IPO tardio
O IPO da WeWork na Nasdaq aconteceu somente em outubro de 2021 por meio de uma fusão com a BowX Acquisition, entidade de cheque em branco (SPAC). O negócio avaliou a rede de coworking em apenas US$ 9 bilhões (hoje caiu para US$ 44 milhões) e lhe deu US$ 1,3 bilhão em caixa. O Softbank também assumiu 80% do controle do negócio e injetou mais grana para tentar salvá-lo, mas não conseguiu grandes efeitos.
A startup já chegou a ter unidades em mais de 100 países; o número caiu para 38 países.
Mas a WeWork vai fechar?
O futuro da WeWork é incerto, porém, a startup não planeja fechar as portas.
“Em um ano, estaremos exatamente onde estamos hoje. Estamos abertos a negócios para meio milhão de pessoas… em todo o mundo”, disse o atual CEO, David Tolley, ao site Associated Press.
“A única diferença é que daqui a um ano a empresa será lucrativa de uma forma que nunca conseguiu no passado”, completou ele. Sua expectativa é de que o acordo de recuperação possa eliminar cerca de US$ 3 bilhões de dívidas. Também diz ter celebrado um acordo de reestruturação com a maior parte dos envolvidos em seus negócios.
No bolo, está a promessa de que franqueados do mundo todo, incluindo unidades do Brasil e América Latina, não sejam afetados. Seus registros oficiais apontam 777 escritórios no mundo, distribuídos em 38 países.
Até lá, a WeWork terá de torcer por uma nova mudança nas dinâmicas de trabalho e negócios, além de queda na concorrência pelos coworkings.
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