O alto comissário para os Direitos Humanos, Volker Turk, afirmou que uma investigação sobre ataques militares israelenses em Gaza apontou que as leis da guerra foram “consistentemente violadas” com uso de bombas extremamente potentes e uma suposta falta de distinção entre combatentes e civis.
A conclusão segue as investigações do Escritório de Direitos Humanos da ONU sobre seis ataques que foram descritos como “emblemáticos” das táticas israelenses na guerra de mais de oito meses, envolvendo o uso suspeito de bombas pesando até 920 kg em prédios residenciais, uma escola, campos de refugiados e um mercado.
Armamentos pesados
Segundo o levantamento, essas armas, que medem aproximadamente 3,4 metros, e outras versões menores, foram utilizadas de 9 de outubro a 2 de dezembro de 2023, causando 218 mortes confirmadas, sendo que o número real de mortes provavelmente é muito maior.
Para Turk, a exigência de selecionar meios e métodos de guerra que evitem ou, pelo menos, minimizem ao máximo os danos aos civis parecem ter sido violados de forma consistente na campanha de Israel.
O relatório citou uma atualização das Forças de Defesa de Israel em 11 de novembro de 2023, informando que a Força Aérea havia “atingido mais de 5 mil alvos para eliminar ameaças em tempo real” desde que começou a bombardear Gaza um mês antes.
Naquela época, as autoridades de saúde de Gaza haviam documentado a morte de 11.078 palestinos, com outros 2,7 mil desaparecidos e cerca de 27.490 supostamente feridos.
Ataques militares
Detalhando os ataques ao bairro de Ash Shuja, na Cidade de Gaza, os autores do relatório observaram que a extensão da destruição mediu aproximadamente 130 metros de largura, destruindo 15 edifícios.
A extensão dos danos aos edifícios e as crateras indicaram que foram usadas aproximadamente nove bombas de cerca de 900 mil quilogramas, deixando pelo menos 60 pessoas mortas.
O relatório aponta que as escolhas de Israel quanto aos métodos e meios de conduzir os combates em Gaza desde 7 de outubro, inclusive por meio do uso extensivo de armas explosivas com efeitos de área ampla em áreas densamente povoadas, não conseguiram garantir a distinção efetiva entre civis e combatentes.
Sons de guerra ininterruptos
O chefe do Escritório de Direitos Humanos no Território Palestino Ocupado, Ajith Sunghay, afirmou que na Faixa de Gaza, as pessoas são forçadas a se abrigar em meio a uma destruição “inimaginável”.
Falando a jornalistas de Amã, após retornar de uma missão de avaliação em vários locais do enclave, Sunghay descreveu como os habitantes de Gaza estão “mal sobrevivendo” após serem repetidamente deslocados pela violência e pelas ordens de evacuação das forças israelenses.
Ele acrescenta que os hospitais estão lotados, o esgoto está vazando nas barracas e não há água limpa. Após visitar Khan Younis, Rafah e Deir-Al-Balah, Sunghay afirmou que, se as bombas não matarem os palestinos na Faixa de Gaza, “a doença o fará”.
Com o som constante de bombas, armas e drones, o representante da ONU afirmou que nunca presenciou tantos desafios para que entidades de direitos humanos e ajuda humanitária operem.
A paisagem de Khan Younis agora está “transformada”, com prédios e infraestrutura total ou parcialmente destruídos. Ele ouviu relatos de pessoas que se mudaram 10 vezes e que mal estão conseguindo sobreviver.
Sem trégua
O foco do relatório é Israel, mas ele também destaca que os grupos armados palestinos continuaram a disparar mísseis contra o território israelense. A porta-voz do Escritório de Direitos Humanos, Ravina Shamdasani, reforçou essas preocupações e alertou que os comandantes militares de Israel não parecem ter mudado suas táticas em Gaza para poupar civis, de acordo com as leis da guerra.
Shamdasani também fez referência a declarações de oficiais israelenses de alto nível, incluindo um membro das forças de Israel que teria dito: “Vocês queriam o inferno, terão o inferno”.
Ela afirmou que há “um padrão contínuo” no uso de determinados tipos de armas, nos meios e na maneira como foram utilizadas. Além disso, algumas declarações de oficiais israelenses levantam preocupações muito sérias sobre a conformidade com a lei humanitária internacional.
Pedido de investigação israelense
Shamdasani também insistiu na necessidade de investigações independentes sobre os ataques cobertos pelo relatório, a fim de decidir se eles constituem crimes de guerra e responsabilizar os autores.
Ela explicou que com o passar do tempo, fica muito mais difícil realizar essas investigações. Segundo Shamdasani, as autoridades israelenses devem tomar medidas para garantir a realização de investigações adequadas e transparentes. A porta-voz adicionou que se isso não acontecer, e se a impunidade continuar, será necessária uma ação internacional.