Os espectadores mais atentos dos jogos de futebol já notaram que os acréscimos dados pelos árbitros aumentaram bastante.
Isso começou a ocorrer na Copa do Mundo de 2022, quando, por determinação da Fifa, a arbitragem passou a ampliar o tempo das partidas.
O objetivo era compensar a falta de bola rolando não apenas devido às paradas para substituições, por lesões ou “cera” mas também pelo tempo usado nas comemorações de gols e para consulta ao VAR (árbitro de vídeo).
Percebe-se que os acréscimos no primeiro tempo, antes de um ou dois minutos, subiram para três ou quatro (ou mais); no segundo tempo, quatro ou cinco minutos passaram para sete, oito, nove (ou mais).
Ficou famoso o jogo no Mundial no Qatar entre Inglaterra e Irã, apitado pelo brasileiro Raphael Claus, que teve 27 minutos além dos tradicionais 90 e se tornou o mais longo da história das Copas.
Esse cenário recente, ao qual todos estão se acostumando, recebeu dia atrás críticas da Uefa, a entidade que controla o futebol na Europa.
Para o ex-jogador croata Zvonimir Boban, 54, dirigente e consultor da Uefa, é um “absurdo completo” a elevação do tempo de acréscimos, e a ideia é que os árbitros das competições europeias, incluindo a badalada Champions League, não exagerem na extensão das partidas.
Boban afirma que o “bem-estar” dos jogadores deve vir em primeiro lugar e que a alta nos acréscimos pode fazer com que alguns, conforme cálculo da entidade, joguem 500 minutos a mais por temporada, ou o equivalente a mais de cinco jogos, ampliando significativamente o desgaste físico.
De acordo com ele, que se pronunciou antes do sorteio da fase de grupos da Champions League 2023/2024, as partidas da competição na temporada 2022/2023 tiveram mais de 60 minutos, em média, de bola em jogo, acima dos 54 minutos, em média, do afamado Campeonato Inglês.
As declarações de Boban chegaram à Fifa, mais especificamente aos ouvidos do italiano Pierluigi Collina, 63, chefe do departamento de arbitragem da entidade que comanda o futebol mundial. Que as rebateu.
“A Fifa e o International Board [Ifab, órgão que regulamenta as regras do futebol] foram solicitados a lidar com o assunto [tempo de bola rolando] e algumas soluções foram propostas, incluindo o sistema de ‘parar o cronômetro'”, disse ele em comunicado.
“Após um processo de consulta em que participaram representantes de todas as confederações, incluindo a Uefa, o Ifab recomendou que os árbitros calculassem o tempo adicional com mais precisão, aplicando os critérios estabelecidos nas Regras do Jogo.”
Segundo Collina, a ampliação dos acréscimos foi bem recebida por atletas e público: “A reação que tivemos na Copa do Mundo de 2022 e na Copa do Mundo feminina de 2023, tanto por parte das seleções quanto dos espectadores, foi positiva. Pesquisa do Fórum das Ligas Mundiais [organização que representa ligas de futebol] mostrou que 90% dos membros concordaram com os critérios que começaram a ser aplicados”.
“Entendo que quaisquer reformas nas Regras do Jogo podem ser vistas com ceticismo por alguns, mas, como foi o caso com a introdução do VAR, quando as medidas são em defesa do futebol, elas acabam sendo aceitas”, concluiu Collina, que apitou a decisão da Copa de 2002 entre Brasil e Alemanha, no Japão.
Os argumentos de Collina, contudo, não demoveram o Fifpro (sindicato mundial de jogadores profissionais), que se posicionou a favor de Boban, com o intuito de evitar que os futebolistas joguem mais tempo do que o desejado e possam prevenir possíveis lesões.
Há, porém, uma questão não lembrada que torna a fala do representante da Uefa e a atitude do Fifpro estapafúrdias.
A entidade decidiu inchar a Champions League a partir do próximo ano, ampliando de 32 para 36 clubes a fase de grupos, com um novo formato que fará cada equipe atuar duas vezes mais nessa etapa.
Para quem deseja poupar fisicamente os jogadores, essa decisão vai na contramão do discurso, parecendo uma hipocrisia propagar que os acréscimos ampliados podem ser os únicos culpados pela redução do bem-estar dos atletas.
Na prática, sem teorizar ou recorrer a evasivas, o aumento dos minutos jogados será defendido pelo time (e pelos torcedores desse time, seja no estádio ou fora dele) que está perdendo, pois haverá mais tempo para buscar o empate, e condenado pelo time (e pelos torcedores desse time) que estiver ganhando e que deseja que o jogo acabe logo.
Para o amante do futebol que somente vê o jogo por prazer, sem interesse na vitória de uma das equipes, mais minutos serão bem-vindos se o duelo estiver atrativo; caso contrário, serão malquistos. Simples assim.