O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, mencionou o risco de uma derrota para a Rússia se a futura gestão de Donald Trump encerrar a ajuda a Kiev. O republicano, um crítico dos gastos militares dos Estados Unidos, foi reeleito presidente há duas semanas e volta à Casa Branca no dia 20 de janeiro.
“Se cortarem [a ajuda], eu acho que perderemos”, disse Zelenski em uma entrevista à emissora americana Fox News. “É claro que, de qualquer forma, vamos permanecer e lutar. Temos nossa produção, mas não é suficiente para prevalecer. E penso que não é suficiente para sobreviver.”
A Guerra da Ucrânia entrou em uma nova fase nesta terça-feira (19), quando Kiev lançou, pela primeira vez desde o início do conflito, em fevereiro de 2022, mísseis de longo alcance dos EUA contra o território da Rússia.
Segundo o Exército russo, os mísseis tinham como alvo instalações militares na região de Briansk, perto da fronteira. A defesa antiaérea russa teria conseguido destruir cinco projéteis e danificado um.
O ataque ocorreu após Washington, principal aliado da Ucrânia, permitir o uso desse tipo de arma contra Moscou, cedendo a meses de insistência de Zelenski. O presidente americano, Joe Biden, autorizou a escalada dois meses antes de deixar o cargo, atraindo críticas da equipe de Trump, que alertou para o risco de uma “terceira guerra mundial”.
A medida pode ser seguida por outros líderes. O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, por exemplo, pediu aos países do bloco que permitam à Ucrânia usar as armas de longo alcance para atacar alvos dentro da Rússia, como fez Washington.
No Rio de Janeiro para a cúpula do G20, o ministro das Relações Exteriores russo, Serguei Lavrov, afirmou que o ataque ucraniano abre uma “nova fase da guerra do Ocidente contra a Rússia”. “Reagiremos em conformidade”, disse ele. O chanceler assegurou ainda que não era possível usar esses mísseis “sem a ajuda de especialistas e instrutores dos EUA”, que forneceriam “dados de satélite, programação e alvo”.
Pouco antes do ataque de Kiev, o Kremlin divulgou novas regras de emprego de armas nucleares —agora, a política russa determina que Moscou poderá reagir nuclearmente caso o país ou a aliada Belarus enfrentem um ataque “com o uso de armas convencionais que criem uma ameaça crítica à sua soberania e/ou à sua integridade territorial”.
EUA, Reino Unido e União Europeia classificaram a medida de “irresponsável”.
Apesar das ameaças, a situação seguiu escalando na terça. O jornal The Washington Post afirmou que Biden havia aprovado o fornecimento de minas terrestres antipessoais para a Ucrânia para retardar os avanços russos no leste do país.
A autorização foi relatada por outros veículos da imprensa americana ao longo do dia. De acordo com a agência de notícias Reuters, os EUA esperam que a Ucrânia instale as minas em seu próprio território, sem usá-las em áreas povoadas por seus próprios civis, disse um funcionário do governo.
O gabinete de Zelenski, o Ministério da Defesa da Ucrânia, o Ministério da Defesa da Rússia e o Kremlin não responderam imediatamente a pedidos de comentários da Reuters.
Anteriormente, os EUA já haviam fornecido minas terrestres à Ucrânia, mas elas tinham como alvo tanques. As minas antipessoais tentam retardar o avanço das tropas terrestres russas, afirmou o funcionário, que preferiu permanecer anônimo.
Segundo ele, os dispositivos americanos diferem dos russos pois se tornam inertes após um período pré-determinado. Elas requerem uma bateria para detonar e não explodirão uma vez que a bateria se esgote, ainda de acordo com o funcionário.
Em uma mensagem ao Parlamento pelos mil dias de guerra, Zelenski adotou um tom mais seguro em relação ao usado na entrevista à Fox News, afirmando que “a Ucrânia pode vencer a Rússia”. “É muito difícil, mas temos a força interna para conseguir”, disse.
Ele admitiu pela primeira vez, no entanto, que seu país pode ser obrigado a esperar pelo menos até uma era pós-Putin para “restaurar” todo o seu território, atualmente ocupado em 20% pela Rússia.
Zelenski também acusou os líderes do G20 reunidos no Brasil de não reagirem ao decreto assinado por Putin sobre o uso de armas nucleares. “Hoje, os países do G20 se reúnem no Brasil. Disseram algo? Nada”, lamentou.