Na Convenção Nacional Democrata de 1968 em Chicago, manifestantes anti-Guerra do Vietnã entraram em confronto com policiais —cujo papel brutal no confronto foi posteriormente descrito por uma comissão federal como um “motim policial”— desviando o foco da reunião do partido.
Esses jovens manifestantes haviam crescido vendo protestos contínuos —e eficazes— durante o movimento pelos direitos civis e vendo o luto nacional após os assassinatos do presidente John F. Kennedy, do senador Robert F. Kennedy e do reverendo Martin Luther King Jr.
Este último, um ano antes, havia manifestado sua oposição à guerra, dizendo que, embora não estivesse tentando “fazer do Vietnã do Norte ou da Frente Nacional de Libertação paladinos da virtude”, ele queria enfatizar sua crença “de que os Estados Unidos nunca investiriam os fundos ou energias necessários na reabilitação de seus pobres enquanto aventuras como o Vietnã continuassem a atrair homens e habilidades e dinheiro, como um tubo de sucção demoníaco e destrutivo.” Ele disse que era “obrigado a ver a guerra como inimiga dos pobres e atacá-la como tal.”
Era uma geração preparada para protestar, com convicção moral como base de sua indignação sobre a Guerra do Vietnã —a primeira guerra televisionada, na qual os americanos podiam ver os horrores da guerra, quase em tempo real— e o alistamento que viu cerca de 2 milhões de americanos convocados. O movimento contra ela começou principalmente nos campi universitários e cresceu.
É claro que os semestres terminam e que os estudantes voltam para casa no verão. Mas sua oposição à guerra não terminou com o ano acadêmico. Nos meses que antecederam a convenção democrata de 1968, que ocorreu em agosto, os organizadores planejaram um grande protesto, destinado a ser realizado independentemente de ser autorizado, atraindo estudantes de todo o país.
Antes da convenção, Rennie Davis, um dos organizadores, disse ao The New York Times: “Nenhuma negação de um alvará vai impedir as dezenas de milhares de pessoas que estão vindo a Chicago de expressar suas convicções sobre essas questões.”
Tudo isso está acontecendo novamente.
Os jovens, em particular, estão acompanhando a guerra Israel-Hamas nas redes sociais e muitos estão horrorizados com o que veem. Eles também cresceram com movimentos de protesto —Occupy Wall Street, Black Lives Matter, a campanha de controle de armas dos estudantes de Parkland, na Flórida— como pano de fundo de suas vidas. Mais de mil pastores negros pediram a Joe Biden que pressione por um cessar-fogo na Faixa de Gaza. E estamos vendo protestos antiguerra se espalharem pelos campi universitários.
Assim como em 1968, o semestre logo terminará, e esses estudantes partirão para o verão, permitindo mais tempo e energia para que seus esforços se concentrem na convenção em Chicago, em agosto.
Grupos antiguerra já estão planejando grandes protestos na convenção. Hatem Abudayyeh, da Rede Comunitária Palestina dos EUA, recentemente disse ao The Chicago Tribune: “Marcharemos com ou sem permissão. Esta convenção é a mais importante desde 1968, também em Chicago, quando os manifestantes contra a Guerra do Vietnã e o movimento de libertação negra organizaram manifestações em massa que foram violentamente reprimidas.”
E vê-se um apoio substancial à sua causa. Embora a pesquisa da Harvard Youth Poll tenha apontado que os jovens de 18 a 29 anos tendiam a considerar a maioria dos outros grandes problemas, incluindo inflação e imigração, como mais importantes do que o conflito Israel-Palestina, o levantamento conclui que “os jovens americanos apoiam um cessar-fogo permanente em Gaza por uma margem de cinco para um.” E de acordo com uma pesquisa da Universidade Quinnipiac, 53% dos democratas afirmam se opor ao envio de mais ajuda militar a Israel por seus esforços na guerra com o Hamas.
Parece haver um sentimento na campanha de Biden de que pode simplesmente esperar os manifestantes saírem, que as paixões eventualmente desaparecerão e que os eleitores democratas se alinharão quando nos aproximarmos do Dia da Eleição e a escolha entre Biden e Donald Trump se tornar mais clara.
Isso é uma aposta imprudente. Os manifestantes e muitos eleitores estão chateados com algo mais do que uma questão regular de política externa. Muitos acreditam que estão testemunhando um genocídio auxiliado e incentivado por um presidente americano que eles apoiaram. Eles se sentem pessoalmente implicados em um conflito no qual o número de mortos continua a aumentar, sem fim à vista. Esta é uma questão moral para eles, e sua posição não será facilmente alterada.
Não é fácil desver o corpo inerte de uma criança morta nos braços de uma mãe. Não é fácil desver pessoas famintas se escondendo quando são alvejadas. Não é fácil desver os destroços depois que um comboio de caminhões de ajuda alimentar foi alvejado e vários trabalhadores humanitários foram mortos.
As pessoas viram todas essas coisas em suas TVs e telefones. No 7 de Outubro, cerca de 1.200 pessoas em Israel foram mortas e cerca de 240 pessoas foram feitas reféns em um ataque do Hamas. Neste ponto da guerra, mais de 34 mil palestinos foram mortos e mais de 77 mil ficaram feridos, de acordo com autoridades de saúde locais, em uma área com uma população de apenas cerca de 2 milhões de pessoas.
Os números são impressionantes. O nível de sofrimento é inaceitável. Os jovens deixarão esse ponto claro na convenção em Chicago.
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