“O que eu gosto é de treinar no dia a dia.”
Desse modo Carlo Ancelotti respondeu a uma das perguntas, relacionada ao trabalho em seleções nacionais, feitas pela Rádio TV Série A.
A emissora oficial do Campeonato Italiano entrevistou o técnico do Real Madrid, e o diário espanhol AS publicou as respostas.
Surpreendeu-me essa posição de Ancelotti, já que o italiano de 64 anos será, de acordo com a CBF (Confederação Brasileira de Futebol), o treinador do Brasil a partir da metade do ano que vem.
Ancelotti, que nunca declarou que assumirá a seleção brasileira, assim disse em outro questionamento, a respeito do andamento de sua carreira: “Ainda me divirto. Adoro trabalhar todos os dias com os jogadores e encontrar novas soluções para a equipe”.
A equipe em questão é o Real Madrid, com a qual ele tem vínculo até a metade de 2024. Por enquanto, não há notícias sobre uma possível renovação, o que dá à CBF algum crédito em seu discurso sobre a vinda de Ancelotti.
A grande questão, com base nessas afirmações do italiano, gira em torno dos trechos “no dia a dia” e “todos os dias”.
Ancelotti frisa gostar muito desse cotidiano, porém só se consegue estar com os jogadores nessa frequência –seja em treinos, seja em concentrações, seja em viagens, seja em jogos– o técnico de clube.
Quem treina uma seleção possui um trabalho completamente diferente.
O convívio com os atletas nos treinos é reduzido, restrito a dois ou três dias antes das partidas oficiais ou amistosas, e isso em um intervalo de dois ou três meses.
De resto, muita observação, a fim de escolher os convocados para os jogos, e muito estudo, dos adversários e das estratégias a serem aplicadas nos confrontos.
Se Ancelotti não aprecia uma rotina assim, qual o sentido de aceitar comandar uma seleção, sendo que tem as portas abertas para o time que quiser, devido ao excelente currículo (é o maior vencedor da Champions League, com quatro títulos)?
A resposta é: não faz sentido. Tanto que, desde que começou a carreira de técnico, quase 30 anos atrás, ele dirigiu dez clubes –passando por Itália, Inglaterra, França e Alemanha–, mas jamais uma seleção.
Ok, não é uma seleção qualquer, é a do Brasil, a única pentacampeã mundial, com Neymar e companhia. Quem não quereria?
Bom, Muricy Ramalho, que no fundo até queria, não quis em 2010 –convidado, optou por honrar seu contrato com o Fluminense, em época que não era viável dividir o comando do clube e da seleção, como ocorre hoje com o interino Fernando Diniz.
O discurso de Ancelotti pode ter também o objetivo de dissimular, de “jogar para a torcida”, no caso a do Real. Ele sabe que, se disser que está apalavrado com a CBF (supondo que esteja), virará alvo dos fãs da equipe merengue a cada resultado que não seja a vitória.
O treinador, na entrevista ao veículo italiano, reforçou seu compromisso com o Real ao afirmar, em pergunta sobre o futebol da Arábia Saudita, para onde estão migrando técnicos e jogadores famosos: “Não recebi ofertas diretas. E, como todos sabem, estou bem aqui [em Madri]”.
Contudo, mesmo enfatizando seu comprometimento com o Real, Ancelotti não negou que possa vir a ser o comandante da seleção brasileira.
Foi inclusive hábil ao driblar, meio que brincando, o questionamento a respeito do assunto, citando o colega de profissão Luciano Spalletti, novo técnico da Squadra Azzurra, e dando ponto final à entrevista.
“Uma final [de campeonato] entre a Itália de Spalletti e o Brasil de Ancelotti?… Esta foi uma bela entrevista, até logo.”
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