Uma conversa entre os chanceleres do Paquistão e do Irã, países que nos últimos dias trocaram ataques mútuos com drones e mísseis, selou nesta sexta-feira (19) o que se desenha como um novo compromisso de reduzir a tensão na região, disse Islamabad.
Em nota, o governo paquistanês afirmou ter expressado sua disposição para trabalhar com o Irã em “todas as questões”. O anúncio vem após ofensivas serem promovidas por ambos os países, nas maiores intrusões transfronteiriças que os dois viveram nos últimos anos.
Os episódios elevaram a tensão na região do Oriente Médio, já instável devido à guerra entre Israel e a facção terrorista palestina Hamas que se desenrola na Faixa de Gaza há mais de cem dias. Além disso, Irã e Paquistão têm uma história de relações conturbadas.
O comunicado do Ministério das Relações Exteriores do Paquistão desta sexta informava que o chanceler Jalil Abbas Jilani havia conversado com seu homólogo iraniano, Hossein Amirabdollahian, na mesma data, um dia depois de Islamabad realizar ataques aéreos no Irã.
Teerã disse que os bombardeios da véspera, quinta-feira (18), deixaram ao menos nove mortos em uma vila na fronteira de seu território, incluindo quatro crianças. Já o Paquistão afirmou que o ataque iraniano inicial, na terça-feira (16), matou ao menos duas crianças.
O contato ocorre após Jilani fazer outra ligação, esta com seu homólogo turco, na qual Islamabad disse que “o Paquistão não tem interesse ou desejo de uma escalada”.
Amirabdollahian, por sua vez, afirmou segundo a mídia estatal do regime do Irã que “a soberania e a integridade territorial do Paquistão são de grande interesse” para Teerã e que “a cooperação bilateral é essencial para neutralizar e destruir acampamentos de grupos terroristas que atuam em solo paquistanês”.
Os contatos diplomáticos ocorreram paralelamente à convocação, pelo premiê interino do Paquistão, Anwaar ul Haq Kakar, de uma reunião do Comitê de Segurança Nacional, com todos os chefes dos serviços militares presentes. Ele encurtou sua visita ao Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, e voltou para o seu país na quinta-feira.
A reunião concluiu que “os dois países seriam capazes de superar contratempos por meio do diálogo e da diplomacia e abrir o caminho para aprofundar ainda mais suas relações históricas”, de acordo com um comunicado do gabinete do primeiro-ministro.
No entanto, também determinou-se que qualquer tentativa de violar o território do Paquistão “será respondida com toda a força do Estado”.
O premiê paquistanês disse que era do “interesse de ambos os países” que as relações voltassem ao que eram antes dos ataques do Irã. Assim que houve a ofensiva, Islamabad convocou seu embaixador em Teerã de volta ao país e não permitiu a permanência do representante iraniano em seu território. Ações do tipo são vistas com grande preocupação a nível diplomático, uma vez que costumam significar a iminência de uma ruptura oficial de laços entre os países.
O secretário-geral da ONU, o português António Guterres, havia instado as nações a conterem os ataques. Os Estados Unidos também fizeram pedido semelhante, embora o presidente americano, Joe Biden, tenha dito que os confrontos mostraram que o Irã, inimigo de longa data de Washington, “não é bem-visto na região”.
Islamabad disse que atingiu bases do grupo separatista Frente de Libertação do Baluchistão e Exército de Libertação do Baluchistão, enquanto Teerã afirmou que seus drones e mísseis atingiram integrantes do grupo radical Jaish al-Adl.
Os grupos de combatentes operam em uma área que inclui a província sudoeste do Baluchistão, no Paquistão, e a província sudeste de Sistão-Baluchistão, no Irã. Ricas em minerais, ambas são em geral consideradas instáveis e, em grande parte, subdesenvolvidas.
Os grupos atacados por Islamabad têm travado uma insurgência armada há décadas contra o Estado paquistanês, incluindo ataques contra cidadãos chineses e projetos de investimento no Baluchistão.
O Jaish al-Adl, que o Irã atacou, tem uma base islâmica sunita vista como uma ameaça pelo Irã, dominado por um regime xiita. O grupo, que tem ligações com o Estado Islâmico (EI), realizou ataques no Irã contra seu poderoso Exército dos Guardiães da Revolução Islâmica.
No contexto da guerra em Gaza, Irã e seus aliados do chamado “eixo da resistência” têm buscado mostrar sua força na região. Nesta mesma semana, o Irã lançou ataques sobre a Síria, contra supostas bases do EI, e no Iraque, onde disse ter atingido um centro de espionagem israelense.