Substâncias como o LSD, a psilocibina (extraída de cogumelos) ou a DMT (extraída de plantas) são banidas em todo o mundo desde que foram proibidas por uma convenção da ONU em 1971. Desde a invasão da Rússia pela Ucrânia, contudo, vem aumentando entre os profissionais de saúde mental do país no Leste Europeu o número de defensores do uso dessas substâncias na psicoterapia. Afinal, com a guerra, aumentaram também os casos de transtornos mentais graves.
Psicoterapeutas confirmaram que têm usado com frequência cada vez maior essas substâncias, sobretudo no tratamento de soldados com transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) devido aos combates na frente de batalha.
Eles agora pressionam o Parlamento ucraniano para liberar o uso dessas substâncias sob acompanhamento de especialistas.
A diretora do Centro de Tratamento de Veteranos de Guerra do Ministério da Saúde, Ksenia Voznitsyna, diz esperar que a Casa determine as diretrizes para que a terapia com substâncias psicodélicas esteja disponível na Ucrânia.
“Uma sessão normal de psicoterapia dura uma hora, no máximo duas. Uma pessoa com um trauma psíquico necessita de muitas sessões. Por isso a terapia costuma se estender por um ou dois anos”, diz. Mas a terapia apoiada em substâncias psicodélicas pode acelerar o processo de cura.
Ela faz, porém, uma ressalva: “Não é a droga que cura, mas a terapia”, ou seja, a sessão de psicoterapia que ocorre enquanto o paciente está sob o efeito de uma droga como a psilocibina ou o MDMA (popularmente conhecida como ecstasy).
Uma terapia do tipo só pode ser conduzida em centros médicos. Ela dura até oito horas, e exige a supervisão de psicoterapeutas profissionais.
Legalização de uso terapêutico das drogas se aproxima
A Ucrânia se torna, assim, o mais novo cenário de um debate que há décadas opõe os apoiadores e os adversários do uso de drogas na psicoterapia.
Sobretudo nos Estados Unidos, o lobby pelo uso de drogas na psicoterapia é cada vez mais forte. E os defensores da prática têm um apoiador de peso: a Organização dos Veteranos de Guerra das Forças Armadas.
Também o Departamento para Assuntos de Veteranos, uma agência do governo federal, é a favor do uso da MDMA em terapias de transtorno de estresse pós-traumático. Especialistas avaliam que uma autorização seja concedida já em 2024.
Esta seria uma decisão com possíveis consequências também para o uso terapêutico de outras drogas proibidas. Afinal, por que algumas continuariam sendo banidas se uma delas for permitida?
A legalização do uso da MDMA na psicoterapia ganhou força com a publicação de um estudo de fase três na revista científica Nature. Pesquisa bem-sucedidas nesta etapa costumam ser o último passo para a aprovação de uso de um medicamento.
O estudo sobre “segurança e eficácia” do MDMA chegou à conclusão de que a substância “reduziu os sintomas de TEPT e os danos funcionais numa população heterogênea com TEPT de moderado a grave e foi, em geral, bem tolerada”.
Estudos semelhantes com MDMA e psilocibina estão sendo conduzidos também na Europa, segundo a Agência Europeia de Medicamentos (EMA). A diretora da entidade, Emer Cooke, afirmou ao Parlamento Europeu que o órgão reconhece a necessidade de apoiar os desenvolvedores de psicodélicos e de cooperar com eles.
Psilocibina em estágio inicial da doença
Na Alemanha, um estudo sobre terapia com psilocibina extraída dos chamados “cogumelos mágicos” está perto de ser concluído. “Estamos testando a eficácia e a segurança da psilocibina na depressão resistente à terapia”, diz o psiquiatra Gerhard Gründer, da Faculdade de Medicina de Mannheim.
“O que podemos adiantar, de maneira superficial, é que estamos vendo bons resultados num número reduzido de pacientes”, diz Gründer. Para muitos doentes, porém, não há qualquer melhora, acrescenta, o que ele atribui ao fato de eles já sofrerem de forte depressão há muito tempo. “A conclusão do estudo, para nós, é que podemos tratar estágios iniciais da doença.”
Gründer reconhece que o uso do MDMA na terapia de traumas de veteranos de guerra tem obtido bons resultados, mas se mostra cético quanto ao uso de outras substâncias. Ele lembra que o MDMA não pertence ao grupo dos psicodélicos.
Substâncias como a psilocibina “não são usadas em transtornos de estresse pós-traumático na maioria dos estudos clínicos porque há medo de retraumatização”, diz. Ele também critica o uso da terapia no meio da guerra. “Considero extremamente questionável, do ponto de vista ético, que seja seguro fazer algo assim numa zona de guerra.”