A mais recente rodada do Campeonato Espanhol, realizada de sexta-feira (2) a segunda-feira (5), contou na tabela com o clássico madrilenho, Real x Atlético.
O duelo entre o líder (Real) e o quarto colocado, no domingo, deveria ser o centro das atenções na cobertura dos meios de comunicação.
O 1 a 1 no Santiago Bernabéu, com o Atlético empatando nos acréscimos do segundo tempo, até foi, por determinado período.
Isso até a realização, na segunda, do pouco atrativo Rayo Vallecano x Sevilla, times que ocupam a parte de baixo da tabela.
Também em Madri, essa partida, 2 a 1 para o visitante na arena para 15 mil torcedores em que o Rayo manda seus jogos, tomou para si os holofotes.
Não devido à brilhante atuação de um atleta. Sim devido ao que ocorreu com um atleta.
Em alguns setores do no estádio de Vallecas, a torcida fica muito perto do gramado. Tão perto que é possível para quem está na primeira fila ter contato físico com o jogador, se assim desejar, caso ele se aproxime.
Não tinha acontecido até então. Porém aconteceu. E o jeito como aconteceu provocou reações de revolta.
Aos 32 minutos do primeiro tempo, o argentino Lucas Ocampos, 29, atacante do Sevilla que atua pelas pontas, preparava-se para cobrar um arremesso lateral.
Nesse momento, estava a um braço de distância de torcedores do Rayo, sentados às suas costas.
Então ocorreu o inesperado. Um deles, de aparência jovem, esticou a mão esquerda e com um dos dedos cutucou as nádegas de Ocampos. Um gesto vil, asqueroso, obsceno.
O ato durou dois segundos e foi suficiente para causar indignação no jogador, que se virou para o provocador.
A cerca de dois metros do argentino, um segurança, sentado de frente para a torcida, olhou para a cena e não se moveu, como se pensasse: “Não é comigo”.
Simultaneamente, vários torcedores do Rayo que estavam no setor e viram o ocorrido riam e/ou filmavam com celular.
Eis o problema número um, de mentalidade das pessoas: considerar um ato repugnante e desprezível uma brincadeira, algo digno de gozação. O que deveria ser condenado por ser deplorável ganha aprovação.
Em notas, tanto Rayo como Sevilla condenaram o comportamento do torcedor.
Ocampos disse depois do jogo que se conteve para não revidar fisicamente.
“Sempre há um tonto [na torcida], e me segurei porque tenho duas filhas, espero que isso nunca aconteça com elas. Que a Liga leve isso a sério, como a questão do racismo. Que tomem as providências que tenham que tomar.”
Em comunicado, LaLiga, que organiza o campeonato, informou que faria denúncia à Procuradoria de Menores, já que se trata de um caso envolvendo um adolescente –já identificado pela polícia– que ainda não atingiu a maioridade.
Assim, o que pode ser feito legalmente deverá ser feito.
Resta o problema número dois, que vale não só para o estádio em que atua o Rayo mas para qualquer outro em que o público fique próximo demais do campo: a segurança dos jogadores.
Ocampos foi incomodado pelo dedo de um torcedor adversário. Mas, conforme expôs Alberto R. Barbero no diário Marca, no texto intitulado “Não é um gesto, é uma agressão”, poderia ter sido atingido por mais que um dedo.
“O que aconteceu poderia ter acontecido em qualquer outro momento e em qualquer outro lugar. O corpo de Ocampos estava ao alcance de qualquer objeto que pudesse servir como arma”, escreveu o articulista, duvidando da eficácia da revista nos estádios espanhóis.
Esse problema, o segundo, cabe às autoridades esportivas resolver. De forma simples, basta impedir que torcedores ocupem os lugares mais próximos do gramado e, simultaneamente, ampliar a quantidade de seguranças que os vigiam.
O primeiro problema, o da mentalidade, é mais complicado. Envolve educação comportamental, bons modos. Que se aprendem em casa e na escola.
Sem os valores adequados, que impediriam que passasse pela cabeça de qualquer pessoa uma atitude repulsiva como a cometida contra Ocampos, a sociedade não avança em dignidade. Tolera o intolerável. Apequena-se moralmente.
O menor de idade em questão errou, feio, e tem que servir de exemplo a outros jovens (ou velhos) do que não se pode fazer. Dedo em riste para ele.
Que frequente aula de boas maneiras, para aprender que não se toca alguém sem consentimento, muito menos com uma dedada.
E que seja afastado por um tempo considerável dos estádios para que, ao voltar, esteja ciente de que estará lá para torcer, nada além disso.