O conflito arrasador no Sudão forçou milhões de pessoas a fugir da violência e 700 mil sudaneses cruzaram a fronteira com o Chade. A nação vizinha é um dos países mais expostos à mudança climática colocando os sudaneses ainda mais em perigo.
Os que ficaram em casa, no meio do fogo cruzado entre tropas do governo e o grupo paramilitar, sofrem agora com um novo risco: as severas cheias que assolam o Sudão.
Pesquisa alerta para necessidade de financiamento de soluções do clima
Em várias partes do mundo, pessoas forçadas a fugir da guerra, da violência e da perseguição estão enfrentando um novo perigo: um planeta em ebulição com aquecimento global, níveis recordes de emissões de CO2 e muitos males associados a um clima em crise.
Os dados são de um novo relatório divulgado pela Agência da ONU para Refugiados, Acnur, nesta terça-feira.
O estudo “Sem saída: Na linha de frente da mudança climática, do conflito e do deslocamento forçado”, numa tradução livre, mostra que sem financiamento e apoio para adaptação esses riscos formam uma combinação letal de ameaças.
O relatório foi lançado em Baku, no Azerbaijão, onde ocorre a COP29, a Conferência sobre Mudança Climática das Nações Unidas.
Choques climáticos e conflitos cada vez mais interligados
A pesquisa é resultado da cooperação do Acnur com 13 organizações especializadas, instituições de pesquisa e grupos liderados por refugiados. Eles usaram dados que ilustram como os choques climáticos estão interligados com conflitos e piorando a situação das vítimas.
Segundo a ONU, 75% dos 120 milhões de deslocados por força maior em todo o mundo vivem em países já afetados pela mudança climática. E metade estão em locais duplamente alvejados por conflitos e sérios perigos climáticos. Alguns exemplos são Etiópia, Haiti, Mianmar, Somália, Sudão e Síria.
Até 2040, o número de nações enfrentando perigos extremos relacionados ao clima deve subir de 3 para 65. A grande maioria já abriga deslocados internos.
Dobro dos dias de calor extremo até 2050
Muitos assentamentos e acampamentos de refugiados podem registrar o dobro dos dias de calor extremo e perigoso até 2050.
Segundo o alto comissário para Refugiados, Filippo Grandi, a crise climática já está provocando deslocamentos em regiões com grande número de pessoas obrigadas a fugir de suas casas por insegurança e conflito. Com isso, eles terminam sem ter um lugar seguro aonde ir.
Um exemplo é Mianmar, a antiga Birmânia, no sudeste da Ásia. Ali, 72% dos refugiados birmaneses buscaram proteção em Bangladesh, a nação vizinha, que tem sido palco constante de ciclones e enchentes extremas.
Verba de US$ 2 para países frágeis e de US$ 161 para outros ilustra injustiça
O relatório do Acnur ressalta que o financiamento do clima está falhando no alcance dos refugiados, comunidades anfitriãs e outros em situação de conflitos e guerras. Com isso, a capacidade de se adaptar à mudança do clima se deteriora rapidamente.
No momento, muitos países considerados extremamente frágeis recebem US$ 2 num fundo anual de adaptação por pessoa.
Já nos países não frágeis, esta quantia sobre para US$ 161 por pessoa. Mais de 90% dessa verba vai para as capitais, e os arredores ficam quase sem assistência.
Efeito estufa, crise e arapuca
Para Grandi, a emergência climática é uma injustiça profunda. As pessoas forçadas a fugir e as comunidades de acolhimento são os que menos poluem a atmosfera elevando o efeito estufa.
Segundo o líder do Acnur, apesar de sofrerem a maior parte da crise, os bilhões de dólares para mitigação não chegam a essas pessoas que mais precisam e sem uma resposta adequada, a tendência é continuar numa espécie de arapuca.