Nesta segunda-feira o Conselho de Segurança da ONU realizou um debate aberto sobre a “Injustiça Histórica e Reforço da Representação Eficaz da África” no órgão.
A sessão organizada por Serra Leoa, que preside o Conselho em agosto, contou com a participação do secretário-geral da ONU, António Guterres, e do presidente da Assembleia-Geral, Dennis Francis.
Omissão ainda sem solução
Guterres abriu seu discurso afirmando que as “fissuras nos alicerces” do órgão máximo de paz e segurança estão se tornando “grandes demais para serem ignoradas”.
Segundo ele, essa é a origem do constante “impasse e estagnação em torno das crises mais prementes da atualidade”. Além disso, o líder da ONU ressaltou que essas falhas alimentam uma crise mais ampla de credibilidade e legitimidade “que afeta o próprio multilateralismo”.
O secretário-geral ressaltou que o Conselho de Segurança foi concebido pelos vencedores da Segunda Guerra Mundial e reflete as estruturas de poder de 1945. Na época, a maioria dos atuais países africanos ainda estavam sob o domínio colonial e não tinham voz nos assuntos internacionais.
Guterres afirmou que essa omissão permanece até hoje sem solução, visto que não há nenhum membro permanente que represente a África no Conselho de Segurança. Além disso, o número de membros eleitos do continente não é proporcional à sua importância.
Crises com impacto “descomunal” na África
O chefe das Nações Unidas ressaltou que a África está subrepresentada nas estruturas de governança global, desde o Conselho de Segurança até às instituições financeiras internacionais. Porém o continente é sobrerepresentado “nos próprios desafios que estas estruturas foram concebidas para enfrentar”.
Ele destacou que os conflitos, as emergências e as divisões geopolíticas “têm um impacto descomunal nos países africanos”.
Como evidência, Guterres afirmou que quase metade de todos os conflitos regionais ou específicos de cada país na agenda do Conselho dizem respeito a África. Ele disse ainda que essas crises são “frequentemente exacerbadas pela ganância pelos recursos da África, que são vitais para a economia global”.
“Sem segurança africana não há segurança global”
Os países africanos acolhem quase metade de todas as operações de manutenção da paz da ONU, ao mesmo tempo que contribuem com as suas próprias tropas. Atualmente, mais de 40% das forças de manutenção da paz da ONU são africanas.
O secretário-geral enfatizou que “não pode haver segurança global sem segurança africana”. Ele citou exemplos bem sucedidos de parcerias entre a ONU e a União Africana, bem como organizações regionais e sub-regionais, como a Cedao.
Segundo Guterres, em tempos de crise e divisão geopolítica, os países africanos estão frequentemente “entre os primeiros a defender a paz, soluções multilaterais e a adesão ao direito internacional e à Carta das Nações Unidas”.
No entanto, “os esforços e contribuições africanos não estão a ser acompanhados pela representação africana”, disse ele. O líder da ONU disse que sua proposta de uma Nova Agenda para a Paz está conectada com a negociação do Pacto para o Futuro, a ser adotado na Cúpula do Futuro em setembro.
Para Guterres esta negociação é uma oportunidade de reformar a governança global com maior inclusão da África. Ele afirmou que não é apenas uma questão de ética e justiça, mas também “um imperativo estratégico” que pode aumentar a aceitação global das decisões do Conselho, beneficiando a África e o mundo.
O papel da Assembleia-Geral
O presidente da Assembleia-Geral, Dennis Francis, também citou a Cúpula do Futuro, dizendo que o pacto em negociação traz a “injustiça histórica com a África” como uma questão prioritária.
Ele ressaltou que o continente é lar de 54 dos 193 membros das Nações Unidas, ou 28%, e conta com uma população de 1,3 bilhões de pessoas. Para Francis, o fato de que a África continua sendo subrepresentada no Conselho de Segurança “ofende os princípios da equidade e inclusão” e da igualdade soberana dos Estados.
Ele chamou de legítimos os “apelos crescentes” por um Conselho de Segurança que seja mais representativo, responsivo, democrático e transparente.
Além disso, Francis citou apelos por uma Assembleia Geral revitalizada que não só assuma um papel mais importante nas questões de paz e segurança, mas também faça com que “o Conselho preste contas por suas ações, ou inações”.
Ele afirmou que a Assembleia Geral está ativamente engajada nestas reformas no contexto do Conselho Intergovernamental de Negociações.