Uma das maiores conquistas da Casa Branca de Biden, na perspectiva de seus funcionários, se não do país, tem sido negar à imprensa o tipo de vazamentos suculentos que eram constantes sob Donald Trump e frequentes sob seus antecessores. Exceto por um período muito curto, quando houve uma pressão para forçar um presidente envelhecido a sair; foi apenas então que tivemos um gotejamento de informações internas fascinantes.
Por exemplo, descobrimos que Biden não havia realizado uma reunião completa do gabinete desde outubro passado e que seus assessores esperavam perguntas roteirizadas de seus secretários. Descobrimos que suas capacidades atingiam o pico das 10h às 16h e diminuíam fora dessa janela de seis horas. Descobrimos que democratas do Congresso, doadores de campanha e alguns jornalistas tiveram conhecimento do declínio de Biden e não o discutiram publicamente até o fiasco do debate de junho. Descobrimos que ninguém menos que Hunter Biden atuava como um conselheiro próximo de seu pai nos dias cruciais após aquele debate.
Descobrimos até mesmo que, desde o início de seu mandato, os assessores mais próximos da primeira-dama trabalharam para proteger seu marido da equipe que serve a primeira família em suas residências, mesmo que os próprios assessores tivessem acesso incomum à residência —como se fosse essencial criar um casulo de lealdade e silêncio em torno do chefe de Estado, mesmo quando ele não está trabalhando.
Estes são todos fatos interessantes e pertinentes sobre o homem que lidera oficialmente os Estados Unidos em um momento de perigo global —e eles não deixaram de ser pertinentes pelo fato de este presidente não estar mais concorrendo à reeleição.
Por algumas semanas, a cobertura midiática da Casa Branca de Biden construiu a ideia de que havia um grande escândalo aqui, implicando o círculo interno que encorajou o presidente a concorrer à reeleição e depois foi responsável por um engodo em meio ao seu óbvio declínio.
A escala potencial desse escândalo diminuiu agora que o país não está mais sendo solicitado a confiar o Salão Oval a Biden por mais quatro anos. E as preocupações sobre as capacidades de Donald Trump, o candidato envelhecido que está realmente concorrendo à Casa Branca, naturalmente vão reivindicar mais atenção agora que estão contrastadas com uma rival mais jovem.
Mas Biden ainda é o presidente —embora com um “cronograma reduzido” para seus últimos seis meses. As pessoas que prontamente se dispuseram para mais quatro anos de uma Presidência das 10h às 16h ainda estão administrando o governo em seu entorno. Como as coisas continuam acontecendo no mundo —por exemplo, esta semana, a nação que temos armado para uma guerra defensiva decidiu invadir a Rússia —, parece que os EUA poderiam se beneficiar em aprender um pouco mais sobre como a Casa Branca tem funcionado recentemente, e o que um observador perspicaz (digamos, alguém como George Clooney) poderia notar se observasse Biden consistentemente por alguns dias ou apenas 24 horas completas.
Em vez disso, estamos fazendo cumprir o acordo que foi implicitamente oferecido a Biden por seus colegas democratas —que, ao se retirar, ele trocaria a sombra de escândalo pela aura de autossacrifício e passaria seus últimos dias no poder como um Cincinato [romano modesto e já idoso que no século 5 a.C aceitou ser ditador num momento de turbulência política] de seu partido, nobremente retornando ao arado (ou à praia de Delaware, pode ser).
E como esse acordo está funcionando tão bem para sua sucessora designada, que está cercada por cobertura positiva e liderando em algumas pesquisas, a estrutura de incentivos para quem quer ver Trump derrotado parece favorecer não falar mais sobre o declínio do presidente.
Certamente, é melhor para Kamala Harris não ser questionada (assumindo que ela algum dia se digne a ser entrevistada) sobre se participou desse acobertamento ou se foi enganada por ele. De fato, é melhor para Harris não ter seu chefe na conversa política de forma alguma, para separar sua própria identidade da impopularidade de seu governo.
Mas tampouco sabemos se será possível manter os problemas de Biden com segurança em segundo plano, se todos os eventos que exigem dele um papel presidencial serão pequenos sucessos como a recente troca de reféns, situação na qual seus assessores podem simplesmente jurar seu intenso envolvimento nos bastidores.
E se por enquanto o ato de levantar mais questões sobre sua aptidão é entendido como efetivamente pró-Trump, foi assim que essas questões foram entendidas seis meses atrás —e no entanto, aqui estamos, e os democratas deveriam estar gratos por terem sido questionados.
É possível, dependendo das verdadeiras capacidades de Biden, que ele deveria ter renunciado e Kamala deveria ser presidente já —o que provavelmente a colocaria em uma posição melhor para vencer a eleição até do que sua atual lua de mel coloca. Também é possível que venha uma crise nos próximos meses que fará os democratas desejar que ele tivesse renunciado, em vez de permanecer e parecer superado.
Por enquanto, a fervorosa esperança democrata é que possamos declarar a história de Joe Biden como praticamente encerrada e seguir em frente. Mas a realidade é que os eventos, não as esperanças, decidem quando um mandato presidencial está concluído.
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