Negociadores de todo o mundo estão reunidos no Canadá, para a quarta e penúltima sessão de negociação de um tratado internacional vinculante pelo fim da poluição plástica.
A diretora-executiva da organização brasileira ACT Promoção da Saúde, Paula Johns, acompanha de perto as negociações. Ela conversou com a ONU News, de Ottawa, e destacou a preocupação com a ausência de regras claras sobre conflito de interesse nas negociações.
“Grande risco” para a negociação
“O número de participantes da indústria cresceu quase 40% em relação à última rodada de negociação. A representação da indústria é maior do que o número de cientistas que estão aqui presentes. Falta muita transparência também. Então a indústria está aqui presente, com outdoors dizendo que, o último que colocaram na rua hoje, dizendo que o plástico é o herói da Covid-19, o que é uma coisa que eu diria até ofensiva com os profissionais de saúde que morreram na linha de frente, lidando com a pandemia. E você tem umas imagens muito apelativas, colocando ali a imagem de uma pessoa com um respirador dizendo: “Olha, esse plástico salva vidas”. E a gente tem a resposta da sociedade civil, sobre todos os plásticos, quantas vidas eles estão ceifando? O quanto que eles estão contaminando a comida que a gente come, o ar que a gente respira, os rios, mares?”.
A especialista afirmou que os plásticos estão contaminando desde o topo da montanha mais alta do mundo até o ponto mais fundo do oceano.
Para ela, a presença da indústria em torno das negociações representa “um grande risco” de que o acordo não avance em metas claras para a redução da produção de plástico e tenha como foco apenas a gestão do lixo gerado.
Paula Johns defendeu medidas regulatórias como o fim dos subsídios para a produção de plásticos, incluindo a construção de novas fábricas, e tributação dos produtos de consumo. Segundo ela, políticas de gerenciamento da poluição não são suficientes, pois a produção dobrou de volume.
Riscos à saúde da contaminação por plásticos
A diretora do ACT afirmou que de todo o plástico que existe hoje no mundo, menos de 10% é reciclado. Além disso, uma quantidade muito grande deles nem sequer é reciclável. Ela alertou também para os riscos à saúde da contaminação por plásticos.
“A questão do plástico, além de ser uma questão ambiental e que atinge especialmente comunidades e vulnerabiliza todas as ilhas no Pacífico, que estão inundadas de plástico, tem toda a questão dos microplásticos e dos nano plásticos, que têm um forte impacto na saúde. Existem vários disruptores endócrinos, todos os químicos que são utilizados ou que advém da produção. Então você tem isso sim, já foi encontrado. Tem sido encontrado nas últimas pesquisas científicas, na placenta, no sangue humano. Ou seja, todos nós estamos contaminados com microplásticos e nano plásticos. Então, obviamente, do ponto de vista da saúde, é ideal que a gente consiga lidar com isso”.
Consenso crescente para banir alguns tipos de plástico
A especialista citou como exemplos de microplásticos com um “nível enorme de contaminação” as bitucas de cigarro e os alimentos ultraprocessados. Ela disse esperar que as negociações em Ottawa contribuam para que estes “plásticos problemáticos, que estão adoecendo as pessoas” sejam banidos.
Para a diretora executiva do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, Inger Andersen, que discursou na abertura do evento, existe “uma convergência na eliminação dos usos problemáticos e evitáveis” e um “consenso crescente de que o uso único e de curta duração pode desaparecer”.
Após a rodada em Ottawa, o Comitê Intergovernamental de Negociação do tratado internacional sobre poluição plástica se reunirá em Busan, na República da Coreia, a partir de 25 de novembro deste ano. Esta será a etapa final da negociação, que deverá ser seguida por uma conferência diplomática onde os chefes de Estado assinarão o acordo.