O desenvolvimento humano a nível global está em recuperação, mas esse desempenho tem sido parcial, incompleto e desigual. A situação piora a distância entre países ricos e pobres e alimenta a polarização política, segundo o relatório do Índice do Desenvolvimento Humano de 2023/24.
O estudo “Rompendo o Impasse: Reimaginando a cooperação em um mundo polarizado”, traz a classificação atualizada de 191 países com base no Rendimento Nacional Bruto per capita, educação e expectativa de vida. O lançamento foi feito nesta quarta-feira pelo Programa da ONU para o Desenvolvimento, Pnud.
Posicionamento dos países de língua portuguesa
Os três países no topo do Índice de Desenvolvimento Humano são Suíça, Noruega e Islândia. Dentre os países lusófonos, Portugal é o único no grupo com desenvolvimento humano considerado muito alto, na posição 42.
O Brasil ocupa a posição 89, na faixa dos países com desenvolvimento alto. No grupo de nações com resultado médio, estão Cabo Verde, na posição 131, São Tomé e Príncipe, em 141, Angola em 150 e Timor-Leste no lugar 155.
Guiné-Bissau ocupa a posição 179 e Moçambique a 183, ambos no grupo de economias com desenvolvimento humano considerado baixo. Todos os países de língua portuguesa caíram no ranking em comparação com 2021/22, com exceção de Moçambique, que subiu de 185 para 183.
Impacto da polarização no desenvolvimento
O Pnud destaca que os países ricos registram níveis recorde de desenvolvimento humano, no entanto, metade dos países mais pobres do mundo retrocederam, permanecendo abaixo do nível de progresso anterior à crise da Covid-19.
Conforme mencionado no relatório, quase 40% do comércio mundial de bens está concentrado em três ou menos países. Além disso, em 2021 a capitalização de mercado de cada uma das três maiores empresas de tecnologia do mundo ultrapassou o valor do Produto Interno Bruto, PIB, de mais de 90% dos países naquele ano.
O secretário-geral da ONU afirmou que o mundo vive uma “era de polarização” que está afastando a possibilidade de cooperação em temas urgentes como resolução de conflitos e crise climática e tem um “impacto devastador no desenvolvimento sustentável”.
António Guterres disse que o relatório revela que a “melhor esperança para o futuro é combater a retórica divisionista e destacar objetivos comuns que unem a grande maioria das pessoas em todo o mundo”.
“Paradoxo da democracia”
De acordo com o administrador do Pnud, Achim Steiner, o “fracasso da ação coletiva” para fazer avançar o combate à pobreza e às desigualdades “não só prejudica o desenvolvimento humano, mas também agrava a polarização e corrói ainda mais confiança nas pessoas e instituições em todo o mundo.”
O relatório argumenta que o avanço da ação coletiva internacional é dificultado por um emergente “paradoxo da democracia”. Embora nove em cada 10 pessoas em todo o mundo apoiem a democracia, mais da metade dos entrevistados expressaram apoio a líderes que poderiam prejudicar a ordem democrática.
Os autores citam ainda pesquisas que indicam que os países com governos populistas têm taxas de crescimento do Produto Interno Bruto, PIB, mais baixas. Quinze anos após a posse de um governo populista, o PIB per capita é considerado 10% menor do que seria em um cenário de governo não populista.
O documento revela um “sentimento de impotência”, pois 68% das pessoas relatam que consideram ter pouca influência nas decisões do seu governo. Os autores argumentam que essa tendência, somada à polarização alimenta abordagens políticas “voltadas para dentro”.
Riscos para a cooperação internacional
Esse movimento é considerado preocupante, por estar em desacordo com a cooperação global necessária para abordar questões urgentes como a descarbonização das economias, uso indevido de tecnologias digitais e conflitos.
“Apanhada no turbilhão antiglobalização, a cooperação internacional está sendo politizada”, afirma o levantamento.
O relatório sublinha que a “desglobalização” não é viável nem realista no mundo de hoje. O Pnud ressalta que nenhuma região está perto da autossuficiência, uma vez que todos dependem de importações de outras regiões de 25% ou mais de pelo menos um tipo importante de bens e serviços.
Segundo Steiner, “em um mundo marcado pela crescente polarização e divisão, negligenciar o investimento mútuo representa um grave ameaça ao nosso bem-estar e segurança. As abordagens protecionistas não podem resolver o problema complexo, desafios interligados que enfrentamos, incluindo a prevenção de pandemias, as alterações climáticas e a regulamentação”.
O Pnud apela por uma “nova geração dos bens públicos globais”, composta por quatro eixos: o planetário, para estabilidade climática, o digital, para a equidade no acesso a novas tecnologias, o financeiro, para fortalecer a assistência humanitária e o desenvolvimento, bem como a redução da polarização e desinformação.