O secretário-geral da ONU afirmou nesta sexta-feira que está “profundamente preocupado” com os relatos de que bombardeios militares israelenses incluem a inteligência artificial como ferramenta na identificação de alvos, especialmente em áreas residenciais densamente povoadas, “resultando num elevado nível de vítimas civis”.
Falando a jornalistas na sede da ONU em Nova Iorque, António Guterres disse que “nenhuma parte das decisões de vida ou morte que afetam famílias inteiras deve ser delegada ao cálculo frio de algoritmos”.
Apelo por mudança nos procedimentos militares
Ele ressaltou que alerta há muitos anos sobre os perigos de transformar a inteligência artificial em armamento e de reduzir “o papel essencial da agência humana”.
Para o líder das Nações Unidas, a IA deve ser usada como uma força do bem para beneficiar o mundo e não para “travar guerras em uma escala industrial, dificultando o processo de responsabilização”.
Guterres também comentou o assassinato, esta semana, de sete trabalhadores humanitários da World Central Kitchen, afirmando que o governo israelense reconheceu erros.
No entanto, o chefe da ONU ressaltou que “o problema essencial não é quem cometeu os erros, mas sim os procedimentos militares em vigor que permitem que esses erros se multipliquem continuamente”. Segundo ele, o sistema que permite que este tipo de erro seja cometido várias vezes é que precisa mudar. “Precisamos de uma mudança de paradigma”, acrescentou.
Investigação de mortes de trabalhadores humanitários
Guterres defendeu investigações independentes e mudanças significativas no terreno. Ele disse ainda que não se trata apenas deste caso isolado, mas sim de “saber porque cada um dos 196 trabalhadores humanitários” que faleceram até agora em Gaza foram mortos.
O número inclui mais de 175 membros da ONU, a grande maioria da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos, Unrwa, a “espinha dorsal de todos os esforços” de ajuda em Gaza.
Outras vítimas incluem profissionais da Organização Mundial de Saúde e do Programa Mundial de Alimentos, bem como dos Médicos Sem Fronteiras, do Crescente Vermelho e da World Central Kitchen.
Na sequência dos ataques desta semana, as Nações Unidas foram informadas pelo governo israelense da intenção de permitir um aumento significativo da ajuda humanitária distribuída em Gaza.
O secretário-geral disse esperar sinceramente que estas intenções “se concretizem de forma eficaz e rápida, porque a situação em Gaza é absolutamente desesperadora”.
Condenações ao Hamas
Ele destacou que a “velocidade, escala e ferocidade desumana” fazem da guerra em Gaza “o mais mortal dos conflitos para os civis, para os trabalhadores humanitários, para os jornalistas, para os profissionais de saúde e para funcionários da ONU”.
O chefe das Nações Unidas também alertou para o fato de o conflito ser marcado por uma guerra de informação, “obscurecendo os fatos”. Ele disse ainda que negar a entrada de jornalistas internacionais em Gaza está “permitindo o florescimento da desinformação e de narrativas falsas”.
Com o conflito completando seis meses neste domingo, Guterres afirmou que “o dia 7 de outubro é um dia de dor para Israel e para o mundo”. Ele condenou os “abomináveis ataques terroristas em Israel lançados pelo Hamas”.
Além disso, o chefe da ONU deplorou veementemente o “uso da violência sexual e tortura, as agressões e o raptos de civis, o lançamento de foguetes contra alvos civis e a utilização de escudos humanos”.
Direito internacional “destroçado”
O secretário-geral afirmou também que ao longo dos últimos seis meses, a campanha militar israelense trouxe “morte e destruição implacáveis” aos palestinos em Gaza, com estimativas de mais de 32 mil pessoas mortas e mais de 75 mil feridas, a grande maioria mulheres e crianças.
Guterres acrescentou que ‘vidas estão destruídas. O respeito pelo direito humanitário internacional está destroçado”.
Para o líder da ONU, “quando os portões da ajuda são fechados, as portas da fome se abrem”. Mais de metade da população de Gaza enfrenta níveis catastróficos de fome. As crianças em Gaza estão morrendo por falta de comida e água. Guterres afirmou que isso é “incompreensível e totalmente evitável”.