Em 2001, homens e mulheres jovens tinham ideologias políticas semelhantes. As mulheres eram mais propensas a serem progressistas do que os homens, mas apenas um pouco —e esse cenário não mudou muito durante as gestões de George W. Bush e Barack Obama.
Mas algo se transformou por volta de 2016, segundo uma nova análise. Mulheres de 18 a 29 anos tornaram-se significativamente mais de esquerda do que a geração anterior. Hoje, cerca de 40% se identificam como progressistas, em comparação com apenas 19% que dizem ser conservadoras. As opiniões dos jovens homens —que são mais propensos a serem conservadores— mudaram pouco.
É incomum que mudanças na ideologia política sejam tão pronunciadas, dizem cientistas políticos. As jovens mulheres são muito mais progressistas do que as mulheres com 30 anos ou mais, de acordo com o instituto de pesquisa Gallup, que analisou as respostas a 54 perguntas sobre crenças políticas.
Além disso, as jovens mulheres tornaram-se mais de esquerda independentemente de terem ou não frequentado a faculdade, e independentemente de serem brancas ou negras. Essa inclinação para a esquerda está impulsionando a grande diferença de gênero entre os eleitores dessa idade.
Entre as mulheres que têm entre 18 e 29 anos, 67% apoiam a vice-presidente Kamala Harris, segundo uma pesquisa do New York Times/Siena College feita em seis estados decisivos no mês passado, em comparação com 40% dos homens na mesma faixa etária.
Entre os homens jovens, 53% nos mesmos estados apoiam o ex-presidente Donald Trump, em comparação com 29% das mulheres com a mesma idade.
É difícil dizer categoricamente o que mudou para as mulheres jovens nos últimos oito anos, dizem pesquisadores. Mas o movimento sugere que, para uma geração de mulheres que cresceram ouvindo que podiam fazer qualquer coisa, o triplo golpe da derrota de Hillary Clinton para Trump, o movimento #MeToo e a decisão da Suprema Corte de que o aborto não é um direito constitucional moldaram fortemente suas visões políticas.
Elas cresceram em um período no qual se cultivava a autoestima das meninas, o engajamento cívico e a participação em áreas anteriormente masculinas, diz Melissa Deckman, cientista política, presidente da empresa de pesquisa PRRI e autora do livro “The Politics of Gen Z” (A política da geração Z, ainda sem tradução), publicado este mês.
Os eventos desde 2016 deram uma mensagem contraditória, diz ela. “O sexismo não é coisa do passado”, afirma. Isso levou as jovens mulheres a se tornarem mais ativas politicamente. “O resultado de tudo isso é que, quando essas meninas se tornam eleitoras, elas têm mais confiança —‘eficácia política interna’ é o termo que os cientistas políticos usariam. Elas acreditam em sua capacidade de fazer mudanças.”
Em geral, os jovens são mais progressistas do que os mais velhos, mas também menos propensos a votar. No entanto, os dados mostram que as mulheres da geração Z estão altamente engajadas politicamente, e uma maior quantidade delas está votando se comparada aos homens da mesma faixa etária. Eventos políticos que ocorrem quando os eleitores têm cerca de 18 anos são poderosos para moldar suas visões ao longo da vida, mostram as pesquisas.
Juntas, essas tendências sugerem que as jovens mulheres de hoje podem ser uma força democrata de longa data e um desafio para o Partido Republicano.
Em entrevistas, esse grupo diz que a eleição de 2016 foi um ponto de virada. Muitas afirmam que, nas primárias democratas, o senador Bernie Sanders ajudou a moldar suas visões progressistas. À medida que a corrida se tornou em parte um referendo sobre gênero —Hillary concorrendo para ser a primeira presidente mulher, Trump chamando-a de “mulher desagradável” e se gabando de agressão sexual na fita do “Access Hollywood”— essas visões se aprofundaram, dizem.
Danielle Stephenson, 25, afirma que a eleição de Obama parecia um “momento de verdadeira esperança” para uma menina negra crescendo em Birmingham, no Alabama. O mesmo aconteceu com a candidatura de Hillary em seu primeiro ano de faculdade —e a derrota dela foi dolorosa.
O movimento #MeToo, que acelerou no ano seguinte, consolidou as posições políticas de algumas jovens mulheres. Elas conectaram o movimento à vitória de Trump —e ambos abriram seus olhos para a desigualdade de gênero, dizem.
Juntos, os eventos “me empurraram mais para a esquerda”, afirma Kaili Hart, 22, gerente de hotel em Taos, no Novo México.
Para outras mulheres jovens, a revogação, em 2022, da decisão conhecida como Roe vs. Wade, que transformou o aborto em um direito constitucional em 1973, foi a mais impactante.
“Minhas opiniões sempre foram progressistas, mas o que realmente as levou ao nível em que estão agora foi quando Roe vs. Wade foi revogada“, diz Allison Simpson, 25, que trabalha no atendimento ao cliente de assistência médica em Lorain, no estado de Ohio. “Isso realmente me assustou, para ser honesta.”
Shauna Shames, professora associada de ciência política na Universidade Rutgers, diz que os cientistas políticos chamam isso de comportamento político racional em resposta a uma ameaça política, que neste caso foi “perder o controle de direitos que elas consideravam garantidos por muito tempo.”
A análise do Gallup descobriu ainda que três questões adicionais estavam impulsionando mais fortemente as identidades progressistas das jovens mulheres: mudança climática, controle de armas e relações raciais.
Nos últimos oito anos, uma média de 86% das jovens mulheres disse que a atividade humana era responsável pela mudança climática, um aumento de 20 pontos percentuais desde os governos Obama e Bush. Além disso, 74% disseram que as leis sobre armas deveriam ser mais rígidas, um aumento de 16 pontos desde a era Obama.
Outros fatores provavelmente também contribuíram para a mudança das jovens mulheres para a esquerda, afirmam cientistas políticos. Em 2018, um número recorde de mulheres ganhou assentos na Câmara, incluindo Alexandria Ocasio-Cortez, que na época tinha 29 anos, e outras mulheres progressistas.
Ver alguém como você no cargo pode estimular o envolvimento político, afirmam cientistas políticos, especialmente para as mulheres jovens. Em entrevistas com mulheres da geração Z, “todas falaram sobre a influência profunda de pessoas como AOC”, disse Deckman. “Pela primeira vez, elas viram alguém jovem, diversa, orientada para a justiça social, concorrendo ao Congresso e também fazendo tutoriais de maquiagem no TikTok.”
As redes sociais podem ter influenciado as jovens mulheres de maneira diferente de outros grupos, disse Lydia Saad, diretora de pesquisa social dos EUA no Gallup e uma das autoras da análise, porque os algoritmos são ajustados para mostrar às pessoas informações que reforçam suas opiniões.
Ivonne Flores, 29, funcionária no setor de compliance empresarial em Cibolo, no Texas, disse que em sua vida offline as pessoas que ela conhece têm uma variedade de crenças. Mas no TikTok, ela quase sempre ouve pessoas que concordam com ela.
Suas opiniões progressistas se aprofundaram na era Trump, disse ela. Como imigrante do México, ela ficou chateada com a demonização dos imigrantes pelo republicano. Como “uma americana orgulhosa”, ela ficou envergonhada quando ouviu amigos em outros países dizerem que a política dos EUA havia se tornado “uma piada”.
“As pessoas dizem que Trump só fala”, disse Flores. “Mas não foi só conversa quando tiraram de nós o direito ao aborto.”
Os americanos como um todo também se tornaram mais progressistas em relação à mudança climática, ao aborto e ao controle de armas, mas em um grau muito menor.