Capturado na embaixada do México em Quito numa ação repudiada por líderes de todo o mundo, o ex-vice-presidente do Equador Jorge Glas precisou ser levado ao hospital porque tentou se suicidar no começo da semana, disse nesta quarta-feira (10) o ex-presidente equatoriano Rafael Correa.
De acordo com Correa, advogados e filhos conseguiram conversar com Glas nesta quarta, via plataforma Zoom, pela primeira vez desde a prisão. “Confirmamos que a emergência médica foi uma tentativa de suicídio. Ele ainda não comeu e está em greve de fome”, escreveu o ex-presidente na rede social X. “Responsabilizamos [o atual presidente] Daniel Noboa pela integridade física e emocional de Jorge.”
Autoridades já haviam informado que Glas teve de ser hospitalizado na segunda-feira (8) por se recusar a se alimentar na prisão de segurança máxima La Roca, em Guayaquil, para onde fora transferido.
Na ocasião, o serviço penitenciário equatoriano divulgou um comunicado no qual relatava que o ex-vice havia sofrido uma “possível descompensação por sua recusa em consumir os alimentos” e que o estado de saúde dele era estável. A nota, porém, não fez qualquer menção à tentativa de suicídio.
Já a imprensa local, mencionando um relatório da polícia, divulgou também no começo da semana que Glas sofrera um “coma profundo autoinduzido” pelo consumo de medicamentos antidepressivos. Não está claro a qual emergência médica Correa se referiu na publicação da rede social.
Também nas redes, Sonia García, advogada de Glas, publicou imagens da primeira reunião virtual com o ex-vice desde que ele foi preso. Em pouco mais de um minuto, o político conta detalhes de sua captura e relata abusos dos policiais. “Eu tentei levantar, mas não consegui por causa da surra que me deram”, diz ele em vídeo. A polícia equatoriana não havia comentado a declaração até a noite desta terça.
Glas recebeu alta do hospital na terça (9) e retornou à prisão. Segundo a advogada, durante a reunião, ele agradeceu ao governo mexicano e disse que o asilo “não lhe deu liberdade, mas a dignidade de ser uma pessoa perseguida politicamente”.
O ex-vice-presidente, que já foi um dos políticos mais importantes do Equador, refugiava-se na embaixada mexicana em Quito desde dezembro, mas foi capturado na última sexta, quando agentes encapuzados a bordo de carros blindados invadiram o local.
A ação foi criticada por vários países, inclusive o Brasil. A Convenção de Viena, assinada pelo Equador em 1961, determina que Estados signatários devem tomar todas as medidas para proteger a missão diplomática de outras nações em seu território e que seus prédios e propriedades são imunes a buscas e apreensões.
“As instalações da missão serão invioláveis. Os agentes do Estado receptor não poderão entrar nelas, exceto com o consentimento do chefe da missão”, diz o texto em seu artigo 22.
A OEA (Organização dos Estados Americanos) condenou “energicamente” nesta quarta a invasão da embaixada do México. Reunidos na sede da organização em Washington, representantes de todos os países do continente votaram a favor da resolução, com exceção do Equador, que votou contra, e El Salvador, que se absteve. O México, convocado pelo Equador para apresentar seu ponto de vista sobre a operação, não participou da reunião do Conselho Permanente da entidade.
No fim de semana, a OEA já havia denunciado “qualquer ação” que colocasse em risco a inviolabilidade desses espaços. O texto debatido na manhã desta quarta, no entanto, é mais categórico ao “condenar energicamente a invasão”, bem como “os atos de violência perpetrados contra a integridade e a dignidade do pessoal diplomático da missão”.
O documento pede também que todos os países respeitem a Convenção de Viena sobre as Relações Diplomáticas e cumpram a Convenção sobre Asilo Diplomático. Por último, insta Equador e México a iniciarem um diálogo “para resolver este grave assunto de forma construtiva”.
Em nome do governo oboa, o vice-chanceler do Equador, Alejandro Dávalos, acusou o México de promover a impunidade ao conceder asilo a Glas, que estava “condenado e foragido”.
Em um debate na OEA na terça, o Brasil afirmou que o Equador cruzou uma linha vermelha quando invadiu o local. “Nem nos piores e nos mais sombrios tempos das ditaduras militares em nosso continente o direito à inviolabilidade dos locais de missão diplomática foi violado”, disse a diplomacia brasileira.
A invasão sem precedentes a uma embaixada na região foi o estopim da crise entre os dois países, que já se intensificava nos dias anteriores.
A tensão começou quando o presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, afirmou que o assassinato do candidato Fernando Villavicencio nas eleições presidenciais do Equador, em 2023, havia aberto caminhos para a vitória de Noboa. O equatoriano, então, expulsou a embaixadora do México, que respondeu concedendo asilo a Glas.
Após reclamar do que considerou uma reação tímida dos EUA à invasão, Obrador agradeceu, nesta quarta, o “gesto de solidariedade” do país vizinho de condenar “o uso da força contra funcionários da embaixada” e afirmar que o governo equatoriano “ignorou suas obrigações”.
Inicialmente, o Departamento de Estado havia condenado “qualquer violação” da Convenção de Viena e pedido que ambos os países resolvessem suas diferenças “em conjunto”.
Também nesta quarta, o presidente mexicano disse que seu governo apresentará na quinta-feira (11) uma denúncia contra o Equador na Corte Internacional de Justiça. “[O texto] foi analisado mais cedo e, originalmente, pensávamos em apresentar a denúncia hoje, mas vamos fazê-lo amanhã para ajustar algumas coisas”, afirmou.
Glas é ligado ao ex-presidente Rafael Correa e serviu como vice no país em duas ocasiões. Primeiro, sob o próprio Correa. Depois, sob Lenín Moreno, com quem acabou rompendo. Ele tinha um mandado de prisão pendente contra si devido a condenações por corrupção.
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