O abuso sexual como arma de guerra tem “endereço direto”: as mulheres. O alerta é da embaixadora brasileira Glivânia Oliveira, que participou das discussões desta semana no Conselho de Segurança sobre a participação das mulheres na paz e segurança internacionais.
Após o evento anual sobre o tema, ela falou à ONU News e ressaltou que a violência sexual é “inacreditável” e “inaceitável”. Glivânia Oliveira adicionou que investigações, condenações e punições relacionadas a violações cometidas especificamente contra mulheres em conflitos armados tem que “ser levadas a sério”.
Abuso sexual é inaceitável
“É inacreditável que hoje no mundo a gente ainda tenha abuso sexual sendo cometido e sendo usado como arma de guerra. Isso é absolutamente inacreditável. Nós lamentamos que sejam usados mísseis, armas e tudo mais, mas existe esta outra arma e ela tem um endereço direto, que são as mulheres, as meninas, as crianças. Isso é a expressão da desumanidade. E o que eu acho que nós queremos trazer e estabelecer é um padrão de que isso é inaceitável. Isso é absolutamente inaceitável.”
Ela ressaltou que mulheres, jovens e crianças, que geralmente recebem cuidados de outras mulheres, são as principais vítimas de conflitos.
Participação de mulheres aumenta chance de sucesso
No Conselho de Segurança, a embaixadora apresentou sua experiência como chefe da delegação brasileira na Mesa de Diálogos de Paz entre o Estado colombiano e o Exército de Libertação Nacional, ELN.
Glivânia Oliveira atribuiu a baixa presença de mulheres em processos de negociação de paz às barreiras sociais “profundas e históricas”, que definem papeis e impedem a participação de mulheres em processos sobre “os destinos da humanidade”.
Segundo a embaixadora, isso é verificado do nível local ao internacional, apesar das pesquisas e estudos que apontam a relação entre a participação de mulheres e processos de paz com melhores resultados.
“Quando as mulheres entram em processos de paz como mediadoras, como negociadoras, normalmente, o que já se concluiu, é que as perspectivas de êxito desses processos são muito melhores. Porque eu acho que enfim, de alguma maneira a vida é importante para todos nós, mas dadas as responsabilidades e condições das mulheres, e aqui a gente pode fazer um longo debate, o fato é que muitos programas, não só em questões de paz e segurança, já reconhecem a contribuição diferenciada e o olhar diferenciado das mulheres nesses processos.”
Negociação com paridade de gênero
Sobre a experiência no contexto colombiano, Glivânia Oliveira disse que se sente muito honrada por ser a diplomata brasileira que está diretamente participando do processo de paz.
Ela lembrou que o conflito entre governo e o ELN se arrasta por 59 anos e já foi objeto de várias tentativas de negociação nos últimos 20 anos, mas que o atual ciclo de diálogos de paz apresenta uma perspectiva de superação da violência.
Os ciclos de negociações entre as partes envolvem vítimas do conflito, de ambos os lados. Na delegação do governo foi estabelecida a paridade de gênero. Do lado do ELN, a embaixadora destacou a participação marcante de mulheres.
Após quatro ciclos de negociação, os avanços foram considerados animadores. As partes lograram, pela primeira vez, acordar e colocar em vigência um cessar-fogo de 180 dias, com possibilidade de extensão.
Também foi estabelecido o Comitê Nacional de Participação, que trabalha, desde 3 de agosto, na elaboração de um grande processo de consultas em todo o país. O Comitê é integrado por 30 setores e 82 membros, dos quais 31 são mulheres, ou seja, 38%.