Na decisão que determinou a busca e apreensão em endereços ligados ao deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, menciona que alta direção da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) teria sido instrumentalizada “para fins ilícitos de monitoramento de alvos de interesse político”. A afirmação tem como base a investigação da Polícia Federal, que apontou a suspeita de ilegalidade. A cúpula da agência era formada por policiais federais cedidos durante a gestão de Ramagem.
Nesta quinta-feira (25), endereços ligados ao deputado, que atuou como diretor-geral da agência, foram alvos de buscas da Polícia Federal. Ramagem é um dos alvos de uma operação que investiga o suposto uso ilegal de uma ferramenta de espionagem em sistemas da agência. A corporação também cita que a atuação do núcleo de alta gestão da Abin tinha o poder de direcionamento das condutas.
Segundo a decisão, havia “pleno conhecimento do desvirtuamento do uso da inteligência” e uma tentativa de “dar uma aparência de legalidade na sua utilização, bem como impedir a apuração” das condutas ilícitas.
De acordo com Moraes, a investigação destaca alguns episódios que fortalecem as suspeitas. Ele cita que um gestor do sistema teria sido flagrado pilotando um drone nas proximidades da residência do então governador do Ceará Camilo Santana (atualmente ministro da Educação). “Comprovando a total ilicitude das condutas”, diz.
“Os policiais federais destacados, sob a direção de Alexandre Ramagem, utilizaram das ferramentas e serviços da Abin para serviços e contrainteligência ilícitos e para interferir em diversas investigações da Polícia Federal, como por exemplo, para tentar fazer prova a favor de Renan Bolsonaro, filho do então presidente Jair Bolsonaro.”
Buscas nesta quinta-feira
A operação da Polícia Federal desta quinta-feira fez buscas em endereços no Distrito Federal, Minas Gerais e Rio de Janeiro, entre eles o gabinete do deputado federal Alexandre Ramagem. A RECORD e o R7 procuraram a assessoria de Ramagem, que disse que não se posicionaria no momento.
A PF também suspendeu sete policiais federais do exercício das funções públicas. As ações desta quinta-feira (25) fazem parte das investigações da Operação Última Milha, deflagrada em outubro de 2023.
A apuração mostrou que os investigados criaram uma estrutura paralela dentro da agência. “[O grupo] utilizou ferramentas e serviços daquela agência de inteligência do Estado para ações ilícitas, produzindo informações para uso político e midiático, para a obtenção de proveitos pessoais e até mesmo para interferir em investigações da Polícia Federal”, explicou a PF.
Os mandados de busca e apreensão são cumpridos nas seguintes cidades:
– Brasília (DF) – 18 mandados;
– Juiz de Fora (MG) – 1 mandado;
– São João Del Rei (MG) – 1 mandado;
– Rio de Janeiro (RJ) – 1 mandado.
Caso os crimes sejam comprovados, os suspeitos podem responder por invasão de dispositivo informático alheio, organização criminosa e interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.
Operação Última Milha
Em 2023, a PF descobriu indícios do uso de mais ferramentas de espionagem ilegal por servidores da Abin — entre elas um programa de invasão de computadores que permitia acesso a todo o conteúdo privado dos alvos. Os softwares foram encontrados nos equipamentos apreendidos durante as buscas. As informações foram repassadas à RECORD por uma fonte da corporação.
A suspeita é que os investigados usavam “técnicas que só são permitidas mediante prévia autorização judicial”.
Em 20 de outubro do ano passado, a PF revelou que um sistema de geolocalização da Abin para dispositivos móveis, como celulares e tablets, teria sido usado em monitoramentos ilegais por servidores mais de 30 mil vezes em dois anos e meio. Entre os alvos da espionagem irregular estariam ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), jornalistas, políticos e adversários do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A PF também cumpriu 25 mandados de busca e apreensão no Distrito Federal, em São Paulo, em Santa Catarina, no Paraná e em Goiás. Os agentes encontraram US$ 171 mil em dinheiro na casa de um dos suspeitos, em Brasília. Além disso, o ministro do STF Alexandre de Moraes determinou o afastamento de outros cinco funcionários da Abin.