Um cessar-fogo em Gaza é “o único caminho” e “do interesse de todos”, já que o conflito no enclave representa uma ameaça à paz e à segurança para palestinos e israelenses por anos ou até mesmo décadas, afirmou a principal autoridade humanitária da ONU no Território Palestino Ocupado nesta quarta-feira.
Lynn Hastings enfatizou que os combates deslocaram quase metade da população da Faixa de Gaza, ou cerca de 1 milhão de pessoas, para Rafah, no sul, agravando a grave crise de saúde e a fome.
Pedido de acesso a reféns e detidos
Ela explica que não há lugar seguro em Gaza por causa dos ataques aéreos e pelas condições criadas pelo deslocamento em massa da população para áreas cada vez menores. Segundo Hastings, isso também coloca em risco a operação humanitária no enclave.
A representante da ONU também insistiu que um cessar-fogo poderia ser propício à libertação dos reféns feitos pelo Hamas durante os ataques terroristas no sul de Israel em 7 de outubro.
O acesso aos parceiros humanitários também deveria ser concedido a equipes médicas detidas pelas forças israelenses, como o diretor do hospital Al-Shifa, que foi alvo de uma incursão militar no mês passado.
De Jerusalém, Hastings falou a jornalistas em Genebra após a votação de terça-feira na Assembleia Geral da ONU, que adotou uma resolução a favor de um “cessar-fogo humanitário imediato”, da libertação imediata e incondicional de todos os reféns e pela garantia de acesso humanitário.
Falta de alimentos para a maioria dos habitantes de Gaza
A representante da ONU enfatizou que, em Gaza, doenças infecciosas se espalham, menos de um terço dos hospitais opera parcialmente, abrigos ultrapassaram sua capacidade e falta comida e água para a maioria da população.
Quase metade dos habitantes do norte e um terço do sul estão passando por “níveis severos de fome”, segundo uma avaliação recente do Programa Mundial de Alimentos, PMA.
Hastings enfatizou que Israel, como ocupante, é responsável pela proteção dos civis palestinos no enclave, provendo suas necessidades básicas e garantindo acesso irrestrito à assistência. Isso significa permitir a passagem de caminhões de ajuda para Gaza e que os humanitários forneçam auxílio a todos que necessitam.
Mercados devem ser abertos
A coordenadora humanitária da ONU enfatizou que o setor de ajuda precisa trabalhar em parceria com o setor público e comercial para apoiar adequadamente a população de Gaza. Assim, ela afirma que os mercados devem ser abertos para evitar uma crise de desnutrição.
Hastings citou a triagem de caminhões de ajuda da ONU no posto de fronteira controlado por Israel em Kerem Shalom na terça-feira, realizada pela primeira vez desde o início da escalada do conflito. Cerca de 80 caminhões foram verificados e liberados antes de serem enviados para Rafah.
Ela reiterou os apelos por uma reabertura completa da passagem de Kerem Shalom para o tráfego humanitário e comercial, que antes de 7 de outubro era o principal ponto de entrada para bens em Gaza, e ressaltou que a passagem de Rafah não foi estruturalmente projetada para a passagem de centenas de caminhões de ajuda.
Destacando a integridade da operação humanitária, Hastings disse que as autoridades israelenses não expressaram preocupações à ONU sobre qualquer desvio de ajuda de seus caminhões em Gaza.
Ataques a instalações da ONU
Sobre a segurança das instalações da ONU na Faixa de Gaza, Hastings mencionou a destruição de uma escola da Agência da ONU de Assistência aos Refugiados Palestinos, Unrwa, em Beit Hanoun, no norte, pelas forças israelenses. Segundo ela, a ONU não estava ciente de qualquer justificativa para essa ação.
Ela também disse que, apesar da ONU informar as partes em conflito sobre a localização de suas instalações, 130 incidentes impactaram unidades da organização desde 7 de outubro e 62 deles resultaram em vítimas. A Unrwa estima que pelo menos 283 deslocados em busca de segurança em seus abrigos foram mortos e quase 1 mil ficaram feridos.
Danos à infraestrutura
Segundo imagens de satélite, cerca de 60% das casas em Gaza já foram danificadas ou destruídas.
Ao abordar relatos sobre o potencial alagamento de túneis subterrâneos em Gaza com água do mar pelo exército israelense, Hastings alertou que causaria “danos severos” à já comprometida estrutura de água e saneamento no enclave, colocaria o ecossistema em risco e criaria a possibilidade de colapso de edifícios e estradas.
Violência e pobreza na Cisjordânia
A coordenadora humanitária da ONU também destacou a situação cada vez mais frágil na Cisjordânia ocupada, onde 464 palestinos já foram mortos este ano, mais da metade desde 7 de outubro.
Cerca de 3 mil foram detidos e não estava claro se seriam acusados e teriam um julgamento. A violência dos colonos também está aumentando, com uma média de cinco incidentes por dia, ante dois por dia no ano passado.
Com a suspensão das permissões para trabalhadores da Cisjordânia em Israel e nos assentamentos, e a interrupção do comércio com Israel, a falta de transferências de receita para a população do território é uma “grave preocupação”, afirmou.