Na última semana, o Conselho de Segurança da ONU ouviu o depoimento de uma ex-criança-soldado que relatou sua realidade após ter sofrido sequestro e forçada a se juntar a um grupo armado na República Democrática do Congo.
Falando anonimamente e por meio de um intérprete, o jovem de 16 anos pediu aos embaixadores que reforcem a proteção e a segurança em zonas de conflito para garantir que menores nunca tenham que participar ativamente dos horrores da guerra.
Realidades difíceis
Em seu testemunho, ele relatou o agravamento da situação de conflito no país e como os menores têm sido vítimas. A criança contou que foi forçado a se juntar a um grupo armado quando estava indo para a escola. O testemunho destacou as realidades brutais enfrentadas por muitas crianças em zonas de conflito.
Segundo o depoimento, há dois meses, durante ataques em duas aldeias vizinhas, as crianças foram novamente alvos de sequestro e forçadas a se juntar a grupos armados, enquanto outras foram sequestradas para manter suas famílias como reféns.
Em sua descrição, ele afirma que isso levou ao assassinato de muitas crianças cujas famílias não têm condições de pagar os resgates exigidos. Além disso, ele afirma que escolas e hospitais são atacados e usados como bases militares.
Ao recordar sua experiência, ele afirmou que implorava para que fosse autorizado a voltar para nossas famílias. A testemunha afirmou que as crianças eram chicoteadas e mantidas sob forte vigilância. O relato incluiu descrições vívidas das privações sofridas, como ser obrigado a saquear alimentos e roubar veículos, com meninas sendo tomadas como “esposas” pelos soldados.
Apelo pessoal aos embaixadores
Depois de três anos acampando, a criança conseguiu fugir e acabou recebendo apoio do programa de desmobilização de menores do governo congolês. Agora, de volta à escola, a testemunha está trabalhando com o parlamento infantil para aumentar a conscientização sobre os direitos das crianças.
Ele pediu que Conselho de Segurança das Nações Unidas trabalhe em conjunto para prestar assistência às crianças afetadas por conflitos. Segundo o sobrevivente, essa assistência ajudará a proteger menores e priorizar o acesso à educação e saúde.
Violações sem precedentes
O testemunho fez parte do debate aberto do Conselho de Segurança sobre crianças e conflitos armados, no qual o órgão de 15 Estados-membros analisa o relatório anual do secretário-geral, juntamente com instruções detalhadas de altos funcionários da ONU, da sociedade civil e de especialistas.
Cobrindo o período de janeiro a dezembro de 2023, o relatório revelou “níveis extremos” de violência contra crianças em conflitos armados, com um número sem precedentes de assassinatos e mutilações.
No ano passado, a ONU verificou um total de 32.990 violações graves contra 22.557 crianças em 26 zonas de conflito, o maior número anual em quase uma década.
As violações mais graves registradas durante 2023 foram em Israel e nos Territórios Palestinos Ocupados, incluindo Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental. Outras nações foram República Democrática do Congo, Mianmar, Nigéria, Somália e Sudão.
As violações contra crianças cobertas pelo relatório incluem sequestro, assassinato, mutilação, recrutamento ou uso em forças e grupos armados, ataques a escolas ou hospitais, estupro ou outras violências sexuais graves e a negação de acesso humanitário.
Violação dos direitos das crianças ‘precisa acabar’
A representante especial do secretário-geral da ONU para Crianças e Conflitos Armado, Virgínia Gamba, enfatizou que a única maneira de avançar é por meio da cooperação, da solidariedade e da vontade política de mitigar, interromper e, por fim, acabar e prevenir as violações contra as crianças.
Ela adicionou que proteger as crianças de conflitos é essencial para quebrar o ciclo de violência e pediu uma cultura de responsabilidade compartilhada para proteger as crianças.
O respeito à lei internacional “é o pré-requisito mínimo para a proteção das crianças” Segundo Gamba, apesar do sólido consenso internacional alcançado sobre essas questões, as partes em conflito “atropelam descaradamente os direitos da criança”, com pouca ou nenhuma consequência.
Funcionários da ONU ecoam os pedidos de proteção
O Conselho de Segurança também ouviu o ex-secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, na qualidade de vice-presidente do The Elders, e Ted Chaiban, diretor executivo adjunto do Fundo das Nações Unidas para a Infância, Unicef.
Ban enfatizou que não deve haver impunidade para aqueles que cometem crimes contra crianças em qualquer lugar do mundo.
Chaiban pediu mais proteção para crianças, promoção da paz e engajamento em uma diplomacia sustentada para acabar e prevenir conflitos, acrescentando que os agentes humanitários, de paz e de desenvolvimento estão prontos para apoiar.