Uma semana ruim para o presidente dos EUA, de 81 anos, tem gerado alarme sobre sua aptidão para concorrer novamente à Casa Branca este ano.
A aptidão de Joe Biden para a presidência foi colocada no centro da corrida eleitoral depois que Robert Hur, o procurador que investiga a posse de documentos confidenciais pelo democrata, divulgou um relatório na quinta-feira (8) citando lapsos de memória preocupantes que Biden teve numa entrevista durante o inquérito, no ano passado.
A avaliação da confusão mental de Biden —que provocou uma resposta irritada dele em uma coletiva de imprensa organizada às pressas na noite de quinta-feira— ofuscou a conclusão do relatório, que foi que o Departamento de Justiça não acusaria criminalmente o presidente.
Mas o documento aponta a idade de Biden como sua maior vulnerabilidade rumo a uma provável revanche pela Casa Branca contra Donald Trump, que tem 77 anos, oferecendo um presente político aos republicanos.
Também reabriu questões sobre se os democratas devem se apressar para encontrar um candidato presidencial diferente —um risco, mas também um pensamento que a Casa Branca não conseguiu extinguir.
Quão prejudicado está Biden?
Biden está entrando em seu ano de reeleição com as piores avaliações de aprovação de qualquer presidente em exercício na história recente. As médias das pesquisas nacionais também mostram que ele está atrás de Trump em uma disputa eleitoral geral.
As preocupações com sua idade são generalizadas em todo o eleitorado, mesmo entre os democratas —e o relatório de Hur oferece alguma validação independente das preocupações. Imagens, vídeos e memes dos erros de Biden e de sua postura rígida se tornaram comuns nas redes sociais e provavelmente se proliferarão ainda mais agora.
Mesmo assim, as forças políticas de Biden foram subestimadas no passado —um elemento de sua fama política que ajudou a consolidar o apoio democrata para sua campanha de reeleição até agora.
Ele entregou uma forte recuperação econômica e políticas industriais e reconstruiu alianças dos EUA. E, com exceção de uma divisão com a esquerda em relação a Israel, Biden tem satisfeito ideologicamente as alas progressista e moderada de seu partido.
Mais importante para os democratas, Biden tem sido um vencedor. Após a vitória presidencial de 2020, ele liderou o partido para um desempenho mais forte do que o esperado nas eleições de meio de mandato de 2022 —quando suas avaliações de aprovação também estavam baixas e as preocupações com sua idade já eram um fator. Seu sucesso até agora é uma grande razão pela qual não houve desafios internos significativos à sua renomeação.
Ainda pode haver uma mudança?
Biden não deu nenhuma inclinação de que abandonaria sua candidatura à reeleição. Mas, se ele fizesse isso, o precedente mais notável seria o de Lyndon Johnson em 1968, que desistiu em março e deixou os democratas rivais lutando pela indicação em um campo aberto.
Hubert Humphrey, seu vice-presidente, enfrentou Robert Kennedy até o assassinato de Kennedy em junho. Humphrey foi indicado durante uma convenção tumultuada em Chicago e depois perdeu para Richard Nixon na eleição geral.
A convenção democrata deste ano também será em Chicago —um eco da corrida de 1968 que não passou despercebido.
Mas, a menos que Biden decida abandonar a candidatura, o caminho para trocar de candidato seria desafiador. Ele tem o total apoio do Comitê Nacional Democrata e um pacto de arrecadação de fundos conjunto com o partido, o que lhe dá uma enorme vantagem.
Até meados de março, é provável que ele tenha garantido votos suficientes dos delegados das primárias democratas para vencer a indicação em Chicago, em agosto. Na cidade, a onda de preocupação entre os democratas teria que ser tão avassaladora que até mesmo os próprios delegados de Biden sentissem a necessidade de mudar de voto.
Após a convenção, seria quase impossível para um novo candidato presidencial democrata substituí-lo na cédula —a menos que ele estivesse incapacitado.
Alguém quer se apresentar?
Poucos candidatos estiveram dispostos a desafiar Biden, exceto Dean Phillips, um congressista de Minnesota, que mal apareceu nas pesquisas e foi derrotado nas primeiras primárias democratas.
A questão é se candidatos democratas mais viáveis estariam dispostos a assumir a liderança. A vice-presidente Kamala Harris seria a sucessora mais natural de Biden, mas suas avaliações de aprovação também estão baixas. Governadores estaduais como Gretchen Whitmer ,de Michigan, Andy Beshear, de Kentucky, ou até mesmo Gavin Newsom, da Califórnia, também seriam possíveis concorrentes.
Mas lançar uma campanha presidencial neste momento —tarde para os ciclos eleitorais americanos que duram mais de um ano— seria um grande risco. Esses candidatos podem preferir esperar até a corrida de 2028 para decidir se concorrerão à Casa Branca.
E embora as pesquisas mostrem que os americanos anseiam por alguém que não seja Biden, não há evidências esmagadoras de que nenhum desses governadores se sairia melhor contra Trump.
E quanto a terceiros?
A vulnerabilidade de Biden em relação à idade, combinada com a impopularidade de Trump, teoricamente deveria abrir um grande espaço para um candidato de terceiros. Robert F. Kennedy Jr., filho do candidato de 1968, já lançou uma candidatura independente, e Jill Stein e Cornel West lançaram suas próprias campanhas pela esquerda. Eles podem influenciar o voto, mas é improvável que impeçam que Biden ou Trump vençam a corrida.
A maior incógnita para 2024 seria uma chapa centrista apoiada pelo movimento “No Labels”, composta por moderados de ambos os partidos. O grupo ainda não escolheu seus candidatos, mas entre os nomes que estão sendo cogitados está Joe Manchin, senador democrata da Virgínia Ocidental.
Nikki Haley, rival republicana de Trump, atacou repetidamente Trump e Biden por serem muito velhos e mentalmente incapazes para a presidência. Mas ela até agora descartou uma candidatura independente. “Sou republicana”, disse ela ao The Wall Street Journal esta semana. “A primária republicana é onde os republicanos concorrem.”
O que Biden pode fazer?
A grande dificuldade para Biden é que sua idade é um fato que ele não pode mudar. Ele e seus assessores afirmam que as preocupações com sua capacidade mental são injustas e destacam que Trump está apenas alguns anos atrás dele —e também propenso a lapsos mentais.
Após o ataque ao Capitólio dos EUA em 6 de janeiro de 2021, alguns membros do gabinete de Trump até discutiram em particular a invocação da 25ª emenda da Constituição para removê-lo do cargo por estar inapto.
Mas a estratégia de Biden até agora —de ignorar e ridicularizar perguntas sobre sua aptidão mental— não tem sido eficaz. Uma mudança de abordagem poderia ser realizar mais entrevistas, reuniões públicas e coletivas de imprensa, em vez de discursos ensaiados e breves trocas com repórteres. Mas isso é um risco, como seus deslizes durante a coletiva de imprensa de quinta-feira mostraram, quando ele confundiu o presidente do Egito com o líder do México.
Outra opção poderia ser fazer um discurso mais sério sobre como ele lida com sua idade e como isso se relaciona com a presidência, assim como seus predecessores John F. Kennedy buscaram quebrar o tabu sobre o catolicismo e a presidência, e Barack Obama confrontou a questão racial.
Caso contrário, ele esperará que os eleitores americanos novamente deixem de lado suas preocupações com sua idade e votem nele em novembro, como a alternativa mais estável e razoável a Trump, outro homem idoso.