Com a Argentina governada pela ultradireita de Javier Milei e indisposta a estabelecer um diálogo de colaboração com o Brasil, a gestão Lula aposta em uma nova aliança estratégica com outro vizinho da América do Sul, a Colômbia, governada pelo esquerdista Gustavo Petro.
Terceira maior economia da região, com uma população maior que a da Argentina e potencial para investimentos na agricultura e no turismo, entre outros, a Colômbia já justificaria a sinalização brasileira antes mesmo de Milei, um presidente nitidamente desinteressado pela integração regional, tomar posse.
Este foi o pano de fundo da visita que Lula fez a Bogotá na última semana. Os gestos e palavras afetuosos predominaram nas duas horas que passaram conversando na Casa de Nariño (sede do governo colombiano).
Também na inauguração da Feira do Livro de Bogotá, que homenageia o Brasil, ambos elogiaram o modo como suas literaturas celebram a natureza e têm pontos de encontro em obras como “Os Sertões”, de Euclides da Cunha (1866-1909), e “La Vorágine”, de José Eustasio Rivera (1888-1928), que descreve o homem e sua relação com a natureza, no caso, a Amazônia colombiana durante o ciclo da borracha.
“Por que é tão difícil os empresários brasileiros olharem para a Colômbia?”, perguntou Lula a empresários dos dois países. Enquanto isso, Petro reforçou que aquilo que antes dividia os dois países, a floresta amazônica, que cobre a fronteira entre ambos, agora deveria ser um elemento para a união com o avanço dos efeitos da mudança climática.
O caminho para uma aproximação efetiva entre Colômbia e Brasil, porém, encontra alguns obstáculos.
Um deles é justamente um dos pontos centrais da nova relação bilateral: a urgente preservação da Amazônia. Apesar de coincidirem em que é necessário salvá-la, os dois têm diferentes abordagens sobre o problema. Com sua retórica quase poética, Petro a trata como essencial ante um provável apocalipse.
Porém, embora sua gestão tenha conseguido reduzir o desmatamento da floresta —a queda passou de 29%, em 2022, para 35% em 2023—, agora a situação não é tão favorável. Existem novos cartéis e facções criminosas instalados na selva que estão usando sua preservação como moeda de troca nas negociações de paz com o Estado para que obtenham algum tipo de anistia.
No caso do Brasil, Lula vê o tema à luz de problemas particulares do país. A Amazônia, do lado brasileiro, é maior e mais habitada, por isso é difícil tanto demarcar terras como tirar dali uma economia já instalada.
Homem culto e extremamente vaidoso, Petro parece ter certo ressentimento da projeção de Lula. A diferença é notória quando os dois falam. Na Colômbia, nas declarações de ambos sobre o tema ambiental, Petro fez uso de sua retórica ilustrada e com expressões de impacto, enquanto Lula soou mais pragmático e até repetitivo.
Alguns funcionários mais próximos de Petro dizem que Lula fala muito da Amazônia no exterior, mas que o país que melhor preserva a floresta é a Colômbia. Foi o caso, por exemplo, de sua própria ministra do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Susana Muhamad, em uma palestra na Universidad de Los Andes, no dia anterior à visita de Lula. Disse ela que o Brasil havia tido “muitas falências em termos de empoderamento político e capacidade prática de resolver os desafios apresentados pelo bioma amazônico”.
Outro desafio de ambos é justamente a presença dessas organizações criminosas transnacionais que se movem entre a fronteira comum, criando um território hostil para a criação de um ambiente que traga investimentos sustentáveis.
Descontadas essas travas, os dois países só têm a ganhar com esse intercâmbio.
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