O Banco Central da China finalmente ouviu os apelos de investidores e especialistas em política econômica. Diante de uma economia com bases cada vez mais trepidantes e consumidores que se recusam a gastar, o órgão liberou nesta semana um generoso pacote que promete colocar bilhões de dólares para girar.
Em frente à imprensa ansiosa, o diretor do BC, Pan Gongsheng, segurava uma folha com a longa lista de medidas a serem implementadas ao longo dos próximos meses. Os chineses resolveram reduzir os juros de hipotecas existentes, reduzir o nível de reservas compulsórias dos bancos estatais e privados operantes no país e flexibilizar as regras para que empresas do moribundo setor imobiliário levantem fundos por meio de empréstimos lastreados nas próprias ações.
Não parou aí. O Ministério das Finanças —segundo a agência de notícias Reuters reportou com exclusividade na quinta-feira (26)— deve revelar em breve um ambicioso plano de emissão de títulos soberanos que podem chegar a astronômicos 2 trilhões de yuans (R$ 1,55 trilhão), boa parte deste para subsidiar a troca de bens de consumo e uma ajuda de custo de cerca de 800 yuans (R$ 620) mensais por criança para famílias com dois ou mais filhos.
Outro trilhão de yuans (R$ 755 bilhões) em emissão especial da dívida soberana deve inundar o mercado para ajudar a levantar recursos para governos provinciais, cuja dívida segue em trajetória crescente desde a pandemia e a estratégia de Covid zero.
Não há precedentes na história recente de um pacote tão generoso sendo anunciado de uma única vez. Isso mostra que o regime, que vinha resistindo a estimular o mercado por meio da dívida por temer a continuidade de vícios e a ineficiência, perdeu esta queda de braço. Mas será o suficiente?
Bom, o mercado reagiu positivamente —aumento o preço do barril de petróleo, ganhos na Bolsa de Xangai e nas ações de empresas com exposição ao mercado chinês (caso, por exemplo, da brasileira Vale, cujas ações subiram mais de 5% puxadas pelo aumento na cotação do minério de ferro). Mas os anúncios resolvem pouco em questões estruturais.
O chinês comum não deixou de gastar apenas porque viu índices ruins na bolsa —o fez por ver o valor dos imóveis, investimentos sólidos na cultura local, derreterem enquanto o custo de vida aumenta e o desemprego juvenil se agrava. Chineses de meia idade precisam lidar com o fato de que vão se aposentar mais tarde, precisarão se preocupar com o sustento de filhos incapazes de acumular capital como antes, além dos gastos com saúde.
Enquanto isso, a purificação ideológica segue firme. Um dos economistas mais notáveis do país desapareceu após postar comentários críticos à política econômica de Xi no WeChat. Segundo o Wall Street Journal, Zhu Hengpeng, que trabalhava há décadas na Academia de Ciências Sociais da China (principal instituição a formular políticas públicas por lá), não aparece em público desde abril após vocalizar suas discordâncias em um grupo privado.
Síndromes dos nossos tempos: um regime centralizado, incapaz de corrigir o curso quando erra por não mais autorizar dissidência interna. Os resultados serão sentidos não só na China, mas no mundo todo.
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