A China anunciou nesta quinta-feira (5) o fim da adoção de crianças chinesas por estrangeiros, encerrando uma prática iniciada em 1992 criada em parte para lidar com o aumento no abandono infantil por consequência da política de filho único.
Ao longo desses mais de 30 anos, mais de 160 mil crianças foram adotadas por famílias de diversos países do mundo —a maioria, cerca de 82 mil, para os Estados Unidos. Essas crianças costumavam ser meninas ou portadoras de alguma deficiência, uma vez que normas culturais chinesas levaram a uma forte preferência por meninos durante a política de filho único.
A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Mao Ning, disse que o governo adotou novas políticas para se alinhar com o avanço da questão internacionalmente. Muitos países têm aumentado restrições à adoção internacional, motivados por relatos de abuso e negligência das crianças adotadas.
“A adoção internacional tem se mostrado muito problemática tanto nos países doadores quanto nos países receptores, e a adoção internacional tem um impacto tanto nos adotados quanto nas famílias biológicas dos adotados”, disse Peter Moller, nascido na Coreia do Sul e levado à Dinamarca que é ativista de um grupo pelos direitos dos coreano-dinamarqueses.
Países como a Etiópia, a Rússia e o Cazaquistão também reduziram ou interromperam as adoções estrangeiras nos últimos anos. Algumas agências europeias de adoção no exterior fecharam as portas em meio a preocupações sobre abuso e documentos falsificados, como na Dinamarca.
Segundo Mao, as únicas exceções na China serão para pessoas que busquem adotar filhos ou enteados de parentes próximos. “Agradecemos aos governos e famílias estrangeiros que desejam adotar crianças chinesas por todo o amor e boas intenções que demonstraram”, disse a porta-voz.
Nos últimos anos, autoridades chinesas têm buscado promover adoções domésticas. As adoções internacionais atingiram o pico e começaram a desacelerar em meados dos anos 2000, à medida que a economia da China crescia e o governo alocava mais dinheiro para sustentar órfãos.
Menos crianças foram colocadas para adoção, um reflexo das taxas de natalidade em desaceleração, de mais apoio para crianças com deficiências e da redução drástica da pobreza. Em 2018, o número de crianças registradas para adoção havia caído para cerca de 15 mil, de cerca de 44 mil em 2009, mostram estatísticas oficiais. Havia 343 mil órfãos na China em 2019, segundo autoridades chinesas.
Alguns chineses podem ter considerado o programa de adoção internacional como uma forma de humilhação nacional, diz Guo Wu, professor associado de estudos chineses no Allegheny College, nos EUA.
A nova proibição “pode refletir os sentimentos populares de crescente orgulho nacional e uma espécie de ressentimento contra os americanos”, disse Wu. “Essa política pode satisfazer o sentimento de que ‘não precisamos enviar nossos filhos para os EUA’.”
A mudança na política também ocorre em um momento de forte queda na taxa de natalidade da China. Pequim vem adotando medidas para incentivar casais a terem mais filhos, mas essa decisão tem ficado mais rara em meio a uma alta no custo de vida e incertezas econômicas no país.