Larnell Robinson sentou-se em uma mesa em seu escritório em setembro, entre uma estante cheia de bíblias e uma mesa em que estavam empilhadas caixas de Narcan, um antídoto para overdoses. Ele mostrou uma lista de moradores do prédio de apartamentos de West Baltimore, onde era presidente do conselho de inquilinos —um entre dezenas de complexos subsidiados que abrigam os idosos pobres da cidade. Um por um, ele começou a riscar nomes, conduzindo um sombrio levantamento dos mortos.
William, 63, morto por fentanil e encontrado em sua unidade no nono andar em fevereiro de 2023. Richard, 61, descoberto em um apartamento com múltiplas drogas em seu sistema duas semanas e meia depois. David, 68, três dias depois, também morto por fentanil.
E então Glenn, 59, que havia morado no mesmo andar de Robinson por anos. Depois de não ver Glenn por um dia, Robinson colocou um panfleto em sua porta. Quando ainda estava lá na manhã seguinte, ele chamou a segurança. Esta foi uma morte, disse Robinson mais tarde, que ele não suportou testemunhar. “Às vezes sinto que trabalho no necrotério.”
Nos últimos seis anos, enquanto Baltimore enfrentava uma das epidemias de drogas mais mortais dos Estados Unidos, as overdoses atingiram surpreendentemente um grupo: homens negros na faixa de 50 a 70 anos. Embora representem apenas 7% da população da cidade, eles respondem por quase 30% das mortes por drogas —uma taxa de mortalidade 20 vezes maior do que a do resto do país.
Homens negros dessa faixa etária na cidade têm mais chances de morrer de overdose do que de câncer ou Covid-19 no auge da pandemia; as drogas estão empatadas com doenças cardíacas como sua principal causa de morte.
Esses homens fazem parte de uma geração perdida pouco reconhecida e tiveram suas vidas moldadas por forças que têm alimentado a crise de drogas da cidade por décadas, de acordo com uma análise dos jornais The New York Times e The Baltimore Banner.
Meio século atrás, empregos na indústria começaram a desaparecer em uma cidade industrial onde as famílias negras tinham poucas oportunidades. Em 1980, quase metade dos homens negros de Baltimore com menos de 30 anos estava desempregada —um nível semelhante ao desemprego negro durante a Grande Depressão.
Ao mesmo tempo, uma onda de drogas ilegais altamente viciantes criou uma economia sombria lucrativa, mas corrosiva. Alguns jovens começaram a vender drogas e depois a usá-las. Muitos foram detidos e encarcerados e nunca encontraram empregos que os permitissem progredir.
Os homens negros de Baltimore dessa geração têm morrido de overdose com algumas das maiores taxas do país desde então, segundo a análise Times/Banner. Mais de 4.000 morreram desde 1993 em meio a ondas de drogas: primeiro heroína e crack, depois opioides prescritos e agora fentanil —a ameaça de drogas mais mortal que os EUA já viram.
Embora números impressionantes de homens brancos mais velhos e mulheres negras também tenham sido mortos, são as mortes entre este grupo —homens negros nascidos entre 1951 e 1970— que elevaram a taxa de overdose fatal de Baltimore muito acima de outras cidades.
Muitos desses homens agora só podem pagar apartamentos subsidiados em complexos para idosos que os moradores dizem frequentemente estar cheios de drogas. Avôs solitários e aposentados que lutam contra sua dependência há décadas de repente estão cercados por tentações ilícitas.
No entanto, houve pouco alcance direcionado às pessoas mais velhas por parte das autoridades de saúde. A cidade concentrou seus esforços de educação sobre drogas nos jovens, e a luta contra as overdoses em prédios para idosos foi em grande parte deixada para pessoas com pouca experiência —um coordenador de programa sem fins lucrativos aqui, um síndico ali.
Autoridades de saúde de Baltimore disseram à reportagem que tomaram medidas contra o problema, incluindo treinar moradores de alguns apartamentos para usar naloxona, o nome genérico do Narcan.
Em uma entrevista, o prefeito Brandon Scott disse que, embora os esforços de prevenção de overdoses da cidade —que incluem grupos que vão aos bairros para fornecer cuidados médicos, Narcan e seringas limpas— não visem a nenhum grupo demográfico específico, eles atendem a um grande número de pessoas negras mais velhas porque são as mais afetadas pela dependência.
Ele disse que não precisava consultar dados sobre as disparidades raciais em overdoses para que fossem aparentes para ele. “Como um homem negro que vive em Baltimore, eu sei, porque vimos isso a vida toda.”
Uma geração que ficou para trás
Baltimore não foi a única cidade a sofrer durante o êxodo da indústria. Filadélfia, Detroit, Chicago e partes de Nova York tiveram taxas iguais ou maiores de desemprego em 1980 entre homens negros dessa geração. Mas Baltimore se destacou, com esses homens morrendo a uma taxa mais alta nos últimos três décadas aqui do que em qualquer outro lugar.
Décadas de pesquisas mostram que o desemprego repentino e generalizado pode criar desvantagens ao longo da vida, associadas a mortes precoces por overdose, álcool e tabagismo. Os contratempos são frequentemente mais fortes para as pessoas que estão chegando à idade adulta quando a recessão ocorre.
A geração anterior tem mais probabilidade de manter seus empregos, e os trabalhadores nascidos posteriormente têm novas opções, diz Hannes Schwandt, professor da Universidade Northwestern que estuda os efeitos de tais mudanças econômicas. Jovens que entram no mercado de trabalho durante recessões têm mais chances de morrer por drogas e álcool do que outros, com os efeitos mais pronunciados surgindo em seus 50 anos, concluiu a pesquisa de Schwandt.
Tensões raciais —e, às vezes, políticas abertamente racistas— também tornaram mais difícil para as pessoas negras dessa geração se recuperarem, de acordo com historiadores e entrevistas com dezenas de pessoas vivas naquela época.
À medida que empregos melhor remunerados se concentraram nos subúrbios, beneficiando famílias brancas que haviam fugido da cidade em grande número desde pelo menos a década de 1960, alguns líderes do condado de Baltimore usaram práticas de zoneamento discriminatórias para desencorajar famílias negras de seguirem o mesmo caminho. A cidade se tornou cada vez mais pobre.
No início dos anos 1980, os jovens adultos de Baltimore tinham algumas das taxas de formatura no ensino médio mais baixas da América. Em 2001, Maryland aprisionou a terceira maior porcentagem de infratores de drogas nos EUA —a grande maioria deles negros. Quase todos os idosos entrevistados para esta reportagem haviam sido encarcerados.
As drogas nos últimos anos se tornaram mais mortais para os idosos em todo o país. Corpos envelhecidos podem ter mais dificuldade em processar narcóticos, e os médicos frequentemente falham em diagnosticar sua dependência.
O fentanil começou a entrar no suprimento de drogas de Baltimore em meados dos anos 2010, e o ritmo de mortes por overdose nos lares de idosos acelerou. Então a pandemia chegou. Os moradores estavam isolados, sem ter para onde ir e nada para fazer, e as drogas ilícitas estavam prontamente disponíveis.
O número de mortes aumentou. Ao menos 77 pessoas morreram por overdose em lares de idosos em 2023, mais do que o dobro do número de 2019, mostram os registros de autópsia.
Poucos esforços para alcançar os idosos
Nos bairros pobres de Baltimore, é de conhecimento comum que o fentanil está cobrando um alto preço dos idosos que há muito lutam contra a dependência. Mesmo assim, o impacto cumulativo das drogas nessa geração não atraiu uma atenção mais ampla de autoridades governamentais, especialistas em saúde ou cientistas sociais.
Em um relatório de 2022, um grupo de trabalho estadual que investigava disparidades raciais identificou as pessoas negras com 55 anos ou mais como o grupo demográfico de crescimento mais rápido em mortes por overdose. Em outro relatório naquele ano, autoridades estaduais de saúde se comprometeram a trabalhar juntas para “entender melhor essas tendências” e encontrar soluções. Eles fizeram a mesma promessa novamente um ano depois.
As recomendações do grupo de trabalho —passos como treinamento adicional e expansão de esforços para ajudar pessoas negras a acessar medicamentos para dependência de opioides— foram em grande parte ignoradas, diz Aliya Jones, que liderou o grupo como secretária adjunta da Administração de Saúde Comportamental do estado de 2020 a 2022.
Em uma entrevista, Laura Herrera Scott, secretária de Saúde de Maryland desde 2023, disse que o estado não havia estudado o padrão maior de mortes entre essa geração. “Nossos dados ou nosso financiamento não são direcionados a esses indivíduos”, afirmou, acrescentando que o estado estava começando a usar dados para focar seus esforços e examinaria mais de perto esse grupo para determinar de que tipo de serviços ele precisa.
Em um comunicado, a cidade disse que o Departamento de Saúde vinha examinando mortes em prédios de idosos e dados de overdose relacionados a adultos mais velhos por um ano e meio, “com um grande foco em identificar exatamente quem está sofrendo overdose nesses locais”. Também disse que realizou treinamentos com naloxona em 13 prédios de idosos em 2023 e em seis prédios até agora neste ano.
No ano passado, um porta-voz do Departamento de Saúde da cidade recusou repetidos pedidos de entrevista, chamando as overdoses entre idosos de um “tema de nicho”. A comissária de saúde, Ihuoma Emenuga, que assumiu o cargo em março, também se recusou a falar com os repórteres do Times/Banner.
Em uma entrevista mais recente, Scott, o prefeito, rejeitou a caracterização feita pelo porta-voz. “Overdose não é um tema de nicho para mim.”
Ele disse que a cidade precisava se concentrar nos fatores que contribuem para a dependência investindo em moradias estáveis e oferecendo oportunidades de emprego e educação.
Quando homens negros têm “empregos negados, uma boa educação negada, a oportunidade negada de serem treinados em qualquer um dos lugares onde outras pessoas estão trabalhando, isso é o que se obtém”, disse o prefeito.