O fundador do WikiLeaks, Julian Assange, declarou-se culpado nesta terça-feira (25) de uma das 18 acusações feitas pelo governo dos Estados Unidos contra ele. Com isso, conclui o acordo que o torna um homem livre depois de doze anos privado de liberdade —ele se refugiou na embaixada do Equador no Reino Unido em 2012 e foi preso pela polícia britânica em 2019.
Como parte do acordo, o jornalista se apresentou a um tribunal no território americano de Saipan, uma ilha no oceano Pacífico que foi escolhida pela relativa proximidade com o país natal de Assange, a Austrália, e pelo fato de que ele se recusava a viajar para os EUA.
Assange chegou à corte em um SUV branco, vestindo terno e gravata, acompanhado do embaixador australiano nos EUA, Kevin Rudd.
Ele concordou em se declarar culpado do crime de disseminação ilegal de material de segurança nacional, pelo qual ele deve ser condenado a cinco anos e dois meses de prisão —exatamente o tempo que esteve preso no Reino Unido, razão pela qual ele sai um homem livre do tribunal. A juíza aprovou o acordo com o governo.
Se tivesse sido condenado por todas as acusações, Assange teria enfrentado um máximo de 170 anos em uma prisão federal.
O acordo com os EUA não foi inesperado. No início deste ano, o primeiro-ministro australiano, Anthony Albanese, sugeriu que os promotores americanos precisavam concluir o caso, e o presidente Joe Biden sinalizou que estava aberto a uma resolução rápida.
Altos funcionários do Departamento de Justiça aceitaram um acordo sem tempo adicional de prisão porque Assange já havia cumprido mais tempo de cárcere do que a maioria das pessoas acusadas de um crime semelhante.
Apoiadores de Assange enxergam seus problemas na Justiça como fruto de perseguição dos EUA depois que ele revelou possíveis crimes cometidos por Washington em guerras como a do Afeganistão e a do Iraque. O governo americano, por sua vez, diz que os vazamentos do WikiLeaks colocaram vidas de militares em perigo.
O site foi responsável por um enorme vazamento de documentos confidenciais do governo americano em 2010, o que colocou Assange na mira de Washington.
A Austrália pressiona os EUA pela soltura de Assange há anos. “O governo australiano deve agir em prol de qualquer australiano que esteja na posição de um encarceramento prolongado sem resolução legal, e foi o que fizemos”, disse o vice-primeiro ministro do país, Richard Marles, em entrevista a uma emissora local.
Marles disse ainda que a resolução e a soltura de Assange não significariam uma piora na relação entre Canberra e Washington.
A esposa do jornalista, Stella Assange, disse mais cedo nesta terça que estava feliz com a decisão, mas ainda irritada por ele ter ficado preso por tanto tempo. Ela afirmou que Assange buscará perdão judicial porque admitir culpa em uma acusação de espionagem preocupa a imprensa ao redor do mundo.
Stella também disse que lançaria uma campanha para arrecadar dinheiro. Isso porque o voo de Londres para Saipan e, posteriormente, para Canberra, segundo a esposa de Assange, custou cerca de US$ 500 mil (R$ 2,7 milhões).
Além disso, afirmou que sempre acreditou que o marido seria libertado. “Estou me sentindo feliz. Mas até que todos os documentos sejam assinados, eu sigo preocupada. Eu só acreditarei quando ele estiver na minha frente e eu puder abraçá-lo. Aí sim será real.”
Defensoras dos direitos das mulheres lamentaram que Assange não tenha sido questionado sobre as acusações de estupro e outros crimes sexuais contra ele na Suécia. Foram esses supostos crimes que o levaram a se refugiar na embaixada do Equador em Londres em 2012 —ele afirmava que, se fosse extraditado para Suécia, o país o entregaria para os EUA. Ele sempre negou as acusações de abuso sexual.
Em 2019, os promotores suecos encerraram de vez a investigação por estupro dizendo que o relato da autora era crível, mas que o tempo havia enfraquecido as evidências.
Linha do tempo
- 2006: Julian Assange funda o WikiLeaks, plataforma para divulgar documentos confidenciais.
- 2010: WikiLeaks publica telegramas diplomáticos e documentos militares dos EUA sobre guerras do Afeganistão e do Iraque. No mesmo ano, duas mulheres na Suécia acusam Assange de crimes sexuais.
- dez.10: Assange é preso em Londres a pedido da Suécia, mas é liberado sob fiança enquanto luta contra extradição.
- jun.2012: Assange busca asilo na Embaixada do Equador em Londres para evitar extradição para a Suécia, permanecendo lá por quase sete anos.
- ago.2012: Equador concede asilo político a Assange.
- mai.2017: Suécia arquiva investigação preliminar de estupro, mas Assange continua na embaixada devido ao risco de extradição para os EUA.
- abr.2019: Equador revoga asilo de Assange, que é retirado da embaixada por autoridades britânicas; ele é preso por violar as condições de fiança no Reino Unido.
- mai.2019: EUA formalizam 18 acusações adicionais sob a Lei de Espionagem contra Assange.
- nov.2019: Suécia reabre e encerra novamente investigação de estupro, citando enfraquecimento de provas.
- set.2020: Iniciam as audiências no Reino Unido para decidir sobre a extradição de Assange para os EUA.
- jan.2021: Um tribunal britânico decide contra a extradição, citando preocupações com a saúde mental de Assange e o risco de suicídio.
- out.2021: Governo dos EUA apela à decisão de não extradição.
- dez.2021: Suprema Corte britânica aceita a extradição, considerando um pacote de garantias dos EUA sobre o tratamento que seria dado a Assange; defesa apresenta recurso.
- jun.2022: Reino Unido aprova a extradição. Mais uma vez, Assange apela à decisão.
- fev.2024: Inicia o julgamento do último recurso de Assange em um tribunal de Londres. Ele não comparece por problemas de saúde, segundo a defesa.
- mai. 2024: Justiça britânica autoriza Assange a apresentar novo recurso contra a extradição, podendo contestar garantias dos EUA sobre seu julgamento.
- jun.2024: Assange faz acordo com os EUA, concorda em se declarar culpado por uma única acusação e deixa a prisão no Reino Unido.