Aristides salvou milhares do Holocausto e um museu honra essa história – EERBONUS
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Aristides salvou milhares do Holocausto e um museu honra essa história

Aristides de Sousa Mendes foi um elo entre milhares de pessoas espalhadas pelo mundo. Não se sabe ao certo quantos vistos terá passado o cônsul português durante a Segunda Guerra Mundial, mas é possível dizer que muitos milhares conseguiram escapar da Europa e do regime nazi com a ajuda do diplomata.

Essas histórias estão agora contadas num museu inaugurado em julho em Cabanas de Viriato, uma pequena vila na cidade portuguesa de Carregal do Sal, terra natal de Sousa Mendes.  O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, enalteceu o papel do diplomata durante o Holocausto.

Importância dos objetos do museu

A presidente da Fundação Aristides de Sousa Mendes, Adelaide Rocha, falou à ONU News da importância dos objetos do museu.

“Não é possível saber ao certo o número de vistos e passaportes que foram passados porque muitas vezes os passaportes e vistos eram passados em nome de uma pessoa e essa pessoa representava uma família. Por outro lado, as pessoas eram tantas que ele deixa de registar.”

A especialista detalhou o conteúdo exposto com marcas de episódios dramáticos de muitas outras famílias ajudadas por Sousa Mendes.

Temos objetos que vieram da casa, temos um violino, uma cadeira, um rádio. Por outro lado temos uma Estrela de David que era da família Rozenfeld que nos cedeu a estrela, uma descendente de Stefan Rozenfled, cedeu-nos a Estrela de David do seu pai. São objetos muito importantes e muito significativos que nos devem fazer pensar e refletir sobre o que teria sido a vida daquelas pessoas se não tivessem sido salvas por Aristides.

Viagem pela vida de Sousa Mendes

Um desses casos é o da família do porta-voz do secretário-geral da ONU. O episódio foi sublinhado por António Guterres na mensagem em vídeo transmitida durante a inauguração e teve impacto entre a família de Aristides.

“Mensagem para a Fundação e para a família e para todas as pessoas que estiveram lá foi extremamente importante. Vinda de alguém que tem tido nos últimos anos um papel importantíssimo na defesa de pessoas que sofrem situações muito semelhantes aquelas que Aristides salvou.”

Em nove salas, os visitantes são convidados a fazer uma viagem pela vida de Sousa Mendes, da sua família e carreira diplomática. 

O cônsul português, Aristides de Sousa Mendes, teve destaque no evento com a presença do secretário-geral, António Guterres.

Sobreviventes dos beneficiados com vistos

Um dos objetos expostos no Museu Aristides de Sousa Mendes, Masm, é uma Estrela de David da família Rozenfeld. Stefan Rozenfled foi um dos últimos sobreviventes dos beneficiados com vistos emitidos por Aristides de Sousa Mendes e chegou a visitar Cabanas de Viriato, antes de morrer com Covid-19 em 2020.

Stefan fugiu de terras polacas, em janeiro de 1940, com cinco anos de idade. Com o visto passado pelo o cônsul de Portugal em Bordéus chegou a Lisboa, embarcando depois com a família para os Estados Unidos.

António Guterres destacou “a compaixão e convicção” de Sousa Mendes, deixando um legado “de vidas salvas e vidas vividas, incluindo uma jovem que, anos mais tarde, se tornaria anos a mãe do meu próprio porta-voz nas Nações Unidas”.

Concessão de vistos e passaportes

O museu com curadoria da historiadora Cláudia Ninhos é também dedicado à vida e à ação humanitária protagonizada pelo cônsul que terminou os seus dias em situação de pobreza, decorrente das sanções impostas por Salazar e do afastamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros pela sua desobediência à Circular n. º14, com medidas restritivas de concessão de vistos e de passaportes, sobretudo a judeus.

Uma casa de família

A presidente da Fundação Aristides de Sousa Mendes revelou que a primeira preocupação da equipa foi dar a sensação a quem entra de que aquele espaço tinha sido uma casa de família.

Adelaide Rocha disse que “é uma casa muito próxima daquilo que tinha sido a casa de Aristides de Sousa Mendes, só que tem um museu lá dentro.”

Com recurso a fotografias e objetos que fizeram parte do espaço, o objetivo foi demonstrar a intensa vida social que marcou a vida da família Sousa Mendes.

A equipa destaca também as condecorações recebidas por Aristides nos diversos postos consulares que ocupou, os muitos escritos de Aristides,  o seu sobretudo ou uma caneta parker com monograma A.S.M.

O cônsul português, Aristides de Sousa Mendes, na lista de oito diplomatas reconhecidos como Justos entre as Nações

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Aristides, o desobediente

O museu dispõe também de objetos que pertenceram a sobreviventes do holocausto, como o relógio de bolso do refugiado Simon Van Den Berg, usado durante o êxodo de 1940, ou a agenda de Denise Blum, uma adolescente que vivia em Paris, quando a Wehrmacht invadiu a França em junho de 1940.

Na agenda é possível encontrar registada a última semana que viveu em solo francês e os passos que a família teve de dar para obter os vistos necessários para a partida.

Aristides de Sousa Mendes nasceu em 1885 em Cabanas de Viriato, numa família abastada. Teve 14 filhos, formou-se em direito na Universidade de Coimbra e, enquanto diplomata, passou por diversos territórios, incluindo a Guiana Britânica, Zanzibar, Curitiba, São Francisco, Bélgica ou Vigo.

Em 1938 rumou a França, assumindo a cadeira consular da cidade de Bordéus. Com a invasão de França em 1940, milhares de refugiados tentavam escapar ao avanço alemão.

Carreira e posto de diplomata

Por ordem ministerial, Aristides de Sousa Mendes não estava autorizado a passar vistos sem autorização prévia, mas decidiu passar vistos sem olhar a quem ou ao número de pessoas.

Adelaide Rocha ressaltou a “uma decisão altruísta e é uma decisão que foi difícil para ele”, conta Adelaide Rocha, acrescentando que Aristides de Sousa Mendes refletiu muito antes de tomar a decisão de desobedecer a ordens de Lisboa, por saber que os seus atos trariam consequências gravosas para si e para a sua família.”

Sousa Mendes acabou demitido da sua carreira e do seu posto de diplomata, sofrendo um revés grande na sua vida.

Só em 1977 é que Portugal iniciou o processo de reabilitação de Aristides de Sousa Mendes, regressando à carreira post mortem com o posto de embaixador. O museu agora inaugurado encerra esse ciclo de restituição do diplomata. 

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