Passada a euforia inicial de seu triunfo no último domingo (22), o peronista Sergio Massa terá agora uma preocupação central: segurar o dólar até o segundo turno das eleições na Argentina. Quanto mais a moeda sobe, mais favorece eleitoralmente seu rival, o ultraliberal Javier Milei, que promete dolarizar a economia.
Só o resultado de Massa nas urnas já conteve de certa forma uma explosão do câmbio paralelo esperada pós-eleições: a moeda teve um aumento de 985 para 1.100 pesos nos último cinco dias, considerado razoável depois de uma semana de muita instabilidade e controles do governo pelo favoritismo de Milei. Mas o ministro sabe que terá que fazer mais.
Dividindo-se entre candidato e ministro da Economia —o que a lei do país vizinho permite—, ele já colocou em marcha novas medidas para frear a divisa. Seu objetivo basicamente é evitar que os cofres públicos fiquem ainda mais vazios das reservas americanas, o que encarece o câmbio e, consequentemente, os preços ao eleitor que votará em 19 de novembro.
Um dia depois de conseguir 36,7% dos votos contra 30% do adversário, Massa escolheu a imprensa estrangeira para dar sua primeira entrevista e anunciar outro estímulo às exportações argentinas. Fez isso em frente a um painel com o logo do ministério, que convive com cartazes eleitorais estampados com seu rosto no mesmo edifício.
O que muda é que, pelos próximos 30 dias, as empresas argentinas que exportam qualquer tipo de produto poderão trocar os dólares que obtém nessas transações por mais pesos. Sem esse incentivo, muitos desses exportadores costumam estocar seus produtos em vez de vendê-los, para se garantir diante de uma inflação que chega a quase 140% anuais.
É como se fosse mais uma cotação do dólar em um mar de outras que já existem no país. “Até eu que acompanho o dólar todos os dias já me perdi”, confessa Alejo Costa, estrategista chefe do banco BTG Pactual na Argentina, que acredita que Massa conseguirá evitar novos sustos no câmbio até o segundo turno com medidas paliativas.
“Sempre há maneiras de conter o dólar a curto prazo”, afirma, o problema é que devem haver consequências no médio prazo. “É a primeira vez que um ministro gera desequilíbrios que ele mesmo vai ter que solucionar, caso ganhe as eleições. E até agora ele ainda não deixou claro como pretende fazê-lo.”
O economista diz isso porque o novo benefício de Massa aos exportadores deve terminar, por outro lado, aumentando a inflação no país. A lógica é: como essas empresas venderão seus produtos por um valor mais caro ao exterior, considerando os pesos que receberão por cada dólar, também devem elevar os preços internamente.
“Além disso, durante toda a semana passada, houve uma grande especulação com alimentos por parte dos produtores e comércios, que retiveram seus produtos à espera do resultado eleitoral. Muitos fecharam ou se negaram a vender, a entregar listas de preços”, diz o economista Gustavo Burachik, professor da Universidade Nacional do Sul (UNS).
Para evitar que todos esses fatores se traduzam em um encarecimento no dia a dia dos argentinos antes do segundo turno, o governo vai literalmente se sentar com os principais empresários do país e definir um limite para o aumento dos preços nas gôndolas, o que é recorrente e costuma ter efeitos limitados.
O último chamado “acordo de preços” feito com diversos setores termina em 31 de outubro, portanto quase 20 dias antes da definição do novo presidente. Por isso, a gestão de Massa já prepara uma nova rodada de negociações para os próximos dias.
“Se foi inflando uma bomba inflacionária muito forte preparada para estourar num eventual triunfo de Milei. Esse cenário eleitoral não aconteceu, e agora o governo impôs uma medida que também tem efeitos inflacionários muito grandes. Portanto agora estão num operativo de encontros e reuniões com empresas para evitar a propagação desses aumentos a todos os preços da economia”, resume Burachik.
Massa até agora tem evitado perguntas sobre quem ocupará seu lugar como ministro da Economia num eventual governo, calculando mais ônus do que bônus num eventual anúncio a essa altura do campeonato. Milei tampouco definiu um nome, mas já apontou que o economista Emilio Ocampo, autor do livro “Dolarização”, seria o responsável por assumir e depois fechar o Banco Central argentino.
Desde o susto com a vitória do rival nas primárias, o peronista tem intensificado sua interferência nos mercados e seu uso da máquina estatal. Ampliou benefícios sociais e conseguiu aprovar no Congresso uma isenção do imposto de renda a 800 mil pessoas, além de congelar o saldo de dólares dos bancos até o fim de outubro, sem afetar pessoas físicas.
Segundo estimativas privadas, essas medidas terão um custo de cerca de 1% do PIB (Produto Interno Bruto) argentino, a ser reposto provavelmente com impostos e outras manobras. Resta saber se elas terão os mesmos efeitos nas urnas que parecem ter tido no primeiro turno.