A Argentina atingiu 57% de pobres e 15% de indigentes em janeiro, os maiores números em 20 anos. Esses índices já seguem uma tendência de aumento há mais de uma década no país, mas dispararam nos últimos dois meses, impulsionados pela explosão de preços após medidas iniciais do presidente Javier Milei.
As projeções são do Observatório da Dívida Social da UCA (Universidade Católica Argentina) e costumam estar um pouco acima dos números oficiais do Indec, o equivalente ao IBGE, que só divulgará no fim de março suas cifras de pobreza do segundo semestre de 2023.
“Após mais de duas décadas de vigência de um regime inflacionário, de empobrecimento e expansão dos programas sociais, aos quais se soma um novo programa econômico de ajuste ortodoxo, a pobreza continua crescendo apesar da assistência pública”, destaca o estudo.
A porcentagem de pobres representa 27 milhões de pessoas se projetada a todo o país. Segundo a série histórica, a última vez em que a Argentina atingiu níveis tão ruins foi em 2004, quando alcançou 55%, durante a gestão do peronista Néstor Kirchner e três anos após uma de suas piores crises econômicas e sociais.
A principal causa desse aumento é a corrida inflacionária que os argentinos têm vivido todos os dias e em todos os setores principalmente desde dezembro, quando Milei assumiu a Presidência, desvalorizou fortemente a moeda local, diminuiu subsídios e eliminou congelamentos impostos pelo seu antecessor Alberto Fernández.
A intenção do ultraliberal é corrigir a distorção dos valores nas gôndolas e estancar a impressão de dinheiro, que gera mais inflação.
Ele quer reduzir os gastos e a interferência do Estado, zerar o déficit fiscal e reequilibrar as contas públicas, admitindo que nos primeiros meses isso exigirá “sacrifícios” da população.
Na sexta-feira (16), o governo comemorou seu primeiro superávit financeiro em janeiro.
“É a primeira vez desde agosto de 2012 que o governo nacional gasta menos do que arrecada e que o pagamento de juros da dívida não deixa as contas no vermelho”, afirmou a gestão em nota.
Nas ruas, porém, o efeito imediato das medidas foi uma instabilidade nos preços, com remarcações que variam muito dependendo do produto, e um freio no consumo.
A classe baixa corta refeições, enquanto a classe média deixa de ir a restaurantes, opta por marcas mais baratas e cancela viagens ou planos de saúde, por exemplo.
Os dados da UCA indicam que a pobreza saltou de 45% no terceiro trimestre de 2023 para 50% em dezembro, e então para 57% em janeiro.
“O maior aumento foi experimentado pelos lares das classes trabalhadoras ou médias não beneficiárias de programas sociais”, diz o órgão.
Já a indigência, que está dentro desse número, passou de 10% no terceiro trimestre de 2023 para 14% em dezembro e 15% em janeiro. O órgão conclui que a elevação dos planos sociais pelo governo de Milei amorteceu o crescimento da indigência que era previsto para o mês passado.
Sua gestão ampliou os valores do auxílio por filho e do cartão alimentar e, na sexta, véspera da volta às aulas, anunciou um incremento no auxílio escolar. Isso ao mesmo tempo em que revisa quem recebe os benefícios e ameaça retirá-los de quem bloquear ruas em protestos.
Segundo Agustín Salvia, diretor do observatório da UCA, a inflação explica cerca de metade dos percentuais de pobreza na Argentina.
“Portanto, se se consegue baixá-la a um dígito, se produzirá um fenômeno de estabilização inclusive no planejamento dos gastos das famílias e nos pequenos negócios. É fácil voltar ao patamar dos 40%”, afirmou ao canal LN+.
Ele pondera também que o país não está passando por uma explosão do desemprego, apesar de ver um aumento do subemprego, o que por enquanto está evitando uma eventual “catástrofe social”.