A Argentina sempre foi um país permissivo em termos migratórios; faz parte da tradição cultural e política do país. Buenos Aires é uma das cidades mais cosmopolitas da América Latina.
No século 19, a imigração de europeus foi estimulada, na gestão de Domingo Faustino Sarmiento (1868-1874). Não é à toa que as comunidades italiana e espanhola marcam até hoje a cultura, a gastronomia e o idioma do país. Também a comunidade judaica argentina está entre as maiores do mundo.
A elite argentina gosta, inclusive, de dizer que os argentinos “vieram dos barcos”. Uma visão preconceituosa que torna invisíveis os povos originários, os afro-argentinos descendentes de escravizados e a população de países vizinhos de situação econômica mais precária.
A mistura de nacionalidades é uma das riquezas do país, como os galeses que até hoje, no sul, mantêm seu idioma e sua cozinha típicas.
Hoje em dia são poucas as dificuldades que se colocam para que estrangeiros pobres de países fronteiriços —peruanos, paraguaios e bolivianos— se instalem na Argentina. É comum encontrar nacionais desses países trabalhando na área de serviços: mercados, construção e cuidados domésticos. O empobrecimento crescente, porém, tem jogado parte desses imigrantes de menos recursos às favelas e à criminalidade.
Paulatinamente, a direita argentina passou a levantar a voz contra essa categoria de imigrantes, pedindo uma legislação mais restritiva. Não é à toa que na gestão de Mauricio Macri (2015-2019) tenha surgido a proposta de expulsão de estrangeiros que cometessem crimes, mas o projeto não foi adiante.
Depois, passaram a vir os estudantes, de estratos mais endinheirados, mas atraídos pelo fato de haver gratuidade e menos competitividade no ensino superior —não há vestibular. Primeiro foram os colombianos, e, mais recentemente, os brasileiros. Cresceu também a entrada de venezuelanos por conta da crise humanitária que vive o país de Nicolás Maduro. Buenos Aires hoje é a cidade das empanadas, mas também das arepas e do arroz chaufa.
Os recentes governos kirchneristas fizeram vista grossa com relação aos trâmites exigidos por leis anteriores a eles para que uma pessoa se radique no país. Essa legislação, que não mudou, determina que as pessoas não devem mentir a oficiais de migração (como em quase qualquer lugar do mundo) e que identifiquem suas intenções ao chegar: turismo, trabalho ou busca de residência.
O que mudou com a chegada de Javier Milei, também descendente de imigrantes? As autoridades migratórias estão mais exigentes para que as regras já existentes sejam cumpridas. A novidade do DNU (decreto de necessidade e urgência) de Milei foi determinar que só poderiam se inscrever nas universidades os estrangeiros que tivessem regularizado sua residência estudantil.
O caso é que, até aqui, é muito comum estudantes entrarem como turistas. Depois, algum dia, vão buscar regularizar sua situação, ou nem isso; saem do país antes de vencer o período permitido, vão passar um dia no Uruguai e voltam, renovando o prazo turístico.
Um dos que se revoltaram contra esse controle foi o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, dizendo que retiraria os estudantes colombianos do país e ofereceria educação gratuita para eles em seu país de origem. Puro teatro; eles não estavam sendo expulsos, apenas se exigiu que realizassem o trâmite correspondente. No caso dos estudantes brasileiros, ocorre algo parecido.
Portanto, é de má-fé afirmar que estejam sendo expulsos por uma questão de racismo ou autoritarismo. Pelo menos por enquanto, não é o caso.
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