O Partido Conservador deve apanhar na eleição desta quinta-feira. Não vai apenas ceder o poder para o Partido Trabalhista, alternância costumeira faz um século. Pode ter o pior resultado da história
É difícil estimar o número de cadeiras que caberá a cada partido, pois o voto é distrital. Pelas projeções mais recentes, os conservadores ficariam com 95 cadeiras (tinham 344 quando o Parlamento foi dissolvido). Os trabalhistas, com 452, 70% do total de 650 parlamentares. Os liberal-democratas teriam 60. O Reform UK, com 5.
Pelas pesquisas de total de votos, o Partido Conservador, com 22%, não ficaria muito longe do Reform UK, do nacionalista xenófobo Nigel Farage, com 17%. Os trabalhistas teriam 39%. Os Liberal-Democratas, 12%.
Não se trata de mudança dramática ou tumultuária, como pode acontecer na França. O próximo premiê será sir Keir Starmer, trabalhista com gosto de biscoito água e sal e uma gota de geleia de frutas vermelhas. Os liberal-democratas são um biscoito de polvilho.
Mais notável é o esfarelamento de mais uma força política tradicional. Aconteceu com a centro-direita e a centro-esquerda francesas. Há grande risco de acontecer com o Partido Social-Democrata da Alemanha, atropelado na eleição legislativa europeia de junho.
Faz mais de década, há revolta contra o “sistema”, ignorada pelas elites políticas tradicionais e por aqueles cientistas políticos para quem está tudo bem e operante, não importa o que pense o povaréu.
Os conservadores estão no poder desde 2010. Foram 14 anos de fato difíceis. A rebarba da Grande Recessão de 2008-09 feriu salários, empregos e finanças públicas, sangria agravada com a recaída europeia na crise, em 2012-2013. Veio a epidemia; a inflação por causa das crises da Covid, de energia e da Ucrânia.
Desde 2010, a renda (PIB) per capita britânica cresceu 11%; na Europa do euro, 13%; nos EUA, 23%.
Desde a Covid, o PIB per capita britânico encolheu 0,5%; o alemão, 1%. O francês cresceu um nada de 0,4%; o americano, mais 6%.
Mas o que os conservadores ofereceram? Um premiê infame como Boris Johnson (2019-22). Liz Truss, a ultraliberal que durou menos que uma alface e quase quebrou o país no seu governo de 45 dias, em 2022.
O feito conservador mais importante foi a grande obra reacionária e de estupidez econômica do Brexit, em 2016, de resto o primeiro grande sucesso de público das campanhas de mentiras das direitas. O atual premiê, Rishi Sunak, tem sido tratado feito um palerma gerador de memes, dados o seu fracasso e gafes ridículas.
Considere-se o quadro pintado até pela “Economist” em um balanço da situação do país. Como se sabe, a revista britânica tem alergia sarcástica a esquerdismos, embora nesta eleição “vote” no trabalhista Starmer.
“O quadro geral é de serviços públicos desmoronando”. O Serviço Nacional de Saúde, pilar da social-democracia britânica, tem a pior taxa de avaliação em sua história de 76 anos. “O despejo frequente de esgotos nos cursos de água do país… é outra metáfora já pronta”. “Os tribunais estão sobrecarregados e as prisões estão lotadas. Autoridades locais estão falindo; bibliotecas e piscinas fecharam”. “Parte do pano de fundo é o programa de austeridade (cortes profundos e rápidos na despesa pública) que começou em 2010. Regiões pobres, que dependem mais do apoio estatal, foram duramente atingidas”.
Segundo dados compilados pela Resolution Foundation, a pobreza absoluta caiu brutalmente no último governo trabalhista (1997-2010), mesmo sendo “Terceira Via”; a economia crescia.
Nos anos conservadores, a redução da pobreza foi lentíssima. Desde 2020, cresceu. Ruim. Mas, pelo menos, a direita extrema parece fora do cardápio britânico. Por ora.
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